06 janeiro 2011

Cegos e Céticos

- Lógica! - disse o professor para si mesmo - Por que não ensinam mais lógica nas escolas? - E dirigindo-se aos meninos declarou: - Só há três possibilidades: ou Lúcia está mentindo; ou está louca; ou está falando a verdade. Ora, vocês sabem que ela não costuma mentir, e é evidente que não está louca. Por isso, enquanto não houver provas em contrário, temos de admitir que está falando a verdade.
Susana olhou para ele muito séria: o professor não estava brincando.
- Mas como é que pode ser verdade, professor?
- E por que você duvida?
- Bem - disse Pedro -, então, se é verdade, por que não encontramos sempre o tal país fantástico ao abrir a porta do guarda-roupa? Não havia nada lá quando olhamos; nem Lúcia teve coragem de fingir que havia.
- E isso prova o quê? - perguntou o professor.
- Ora, ora, se as coisas são verdadeiras, estão sempre onde devem estar.
- Tem certeza, Pedro?
Ele não foi capaz de responder.

Cronicas de Narnia - O Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupas, C. S. Lewis 

Um dialogo aparentemente simples, mas que envolve principalmente 2 coisas que destaco.

Por que não acreditar no relato de alguem sobre algo totalmente fora de nossas expectativas, crenças, naturais? Talvez porque estejamos muito presos ao naturalismo filosófico. E se hoje viesse alguem nos falando que entrou em Nárnia pelo guarda-roupas? - Claro, Lewis inventou esta estória. Mas o que me diz de alguem que relata ter visto e conversando com um anjo? Ou com Deus? O que dizer daqueles relatos que vemos na Bíblia? Sinceramente, creio, este impacto neste muro de pedra que as crianças tiveram ao ouvir sobre Nárnia, é o mesmo que a maioria de nós, senão todos, tem quando pensam a respeito do próprio Divino, daquilo que acreditamos realmente ser possível. Mas que de certo modo, se alguem dissesse que abriu o armário, e se deu com o 'sobre-natural' [sic] provavelmente todos duvidariamos; talvez, duvidariamos, a tal ponto, de abrir a porta do armario e não vermos nada. Ou então, como no inicio do Cronicas de Narnia, iriamos nos deparar com os animais de Narnia, inclusive o Leão, e seriamos incapazes de ouvir as vozes deles, apenas, grunitos, latidos, rangeres...

Outro aspecto, é quando a criança questiona, uma velha questão filosófica, "Ora, ora, se as coisas são verdadeiras, estão sempre onde devem estar." Não é este, de certo modo, implicitamente, a base do que imaginamos ser a Ciencia e o Método Cientifico? Tanto é que, apontamos como certo e verdadeiro, para aquilo que a Estatistica diz ser o mais ideal. "Sempre onde devem estar". Talvez esta seja a grande frustração dos homens modernos quanto não a religião em si, mas quanto a Deus, aos anjos, aos seres divinos. Talvez, uma frustração por não vê-los, ou por não senti-los quando vão a igreja, lêem a Bíblia ou oram... bem, talvez, algumas raras vezes. Olham e apenas vêem um guarda-roupa comum, sem uma luz no fundo que vem do lampião do bosque de Narnia, mas apenas um fundo de madeira compensada.

Até onde nossa imaginação não está presa? Sim, estamos escravos, quase como impedidos de imaginar, de crer, e - mais importante, talvez - de VER 'Nárnia'. Assim sendo, podemos estar cegos, e assim, deixamos de ver muitos fatos, realidades. E de maneira, ainda mais forte, ficamos cegos para o futuro, para a Esperança. Evitamos relacionamentos, evitamos grandes jornadas, aventuras, nos lançar a muita coisa, por temer o futuro, pois tudo o que vemos é o senso comum do armário comum, da porta fechada, de "estabilidade em primeiro lugar". Ora, temos que acreditar no que nosso olho vê, não é assim? Bem, já diria o budogue que seria o faro. E o que vemos senão a concupiscencia do mundo, a infinita jornada atrás da riqueza material, atrás do status academico e profissional, dos caros bens de consumos, de viagens caras por esse mesmo mundo (sim, é o mesmo e patético mundo). É isso o que vemos. Este é o nosso armário. Esta é a nossa esperança. Fora disso, somos tentados a simplesmente imaginar e acreditar: "É loucura!"

Acho que é isso. O mundo moderno talvez se resuma, em uma sociedade cega, uma sociedade incapaz de enxergar e acreditar em Nárnia.

1 comentários:

Valdenor disse...

Eu penso que o grande problema não seja o naturalismo filosófico, e nem mesmo o anti-sobrenaturalismo que é natural para uma cultura que concebe o Universo como algo autônomo, auto-explicável.
O grande problema é que o ser humano, sempre em dúvida contra Deus, não lança a dúvida sobre si próprio, não questiona a si próprio.
Prefiro viver com o paradoxo: eventos que, para minha racionalidade teórica, são comprendidos num nexo natural de causa e efeito, ao mesmo tempo, na fé, podem ser revelados como ação de Deus.
O problema não é Deus estar oculto, invisível; o problema é o ser humano não estar disposto a abandonar tudo e seguir a Deus, quando Deus vai ao encontro da pessoa.
Adoto plenamente o naturalismo filosófico no método científico; adoto plenamente a fé.
Sou cético, mas Deus é cético para comigo...
"Tudo depende do tempo e do acaso", já dizia Eclesiastes 9:11. Um precursor do naturalismo filosófico? Talvez. Um homem de fé? Com certeza.