Segundo o criador do termo, Jean François Lyotard, a "Pós-Modernidade" é a ‘condição sociocultural e estética do capitalismo pós industrial e está relacionada ao rompimento de antigas verdades absolutas como o Marxismo e o Liberalismo, típicos da Modernidade (Lyotard; 1998).
O pensador brasileiro Sérgio Paulo Rouanet, em seu estudo "As Origens do Iluminismo", escreve que ‘ o uso do prefixo pós tem muito mais o sentido de exorcizar o velho (no caso, a Modernidade) que, propriamente, articular o novo (a pós-modernidade). Ele escreve:
"Depois da experiência de duas guerras mundiais, depois de Aushwitz, depois de Hiroshima, vivendo num mundo ameaçado pela aniquilação atômica, pela ressurreição dos velhos fanatismos políticos e religiosos e pela degradação dos ecossistemas, o homem contemporâneo está cansado da modernidade. Todos esses males são atribuídos ao mundo moderno. Essa atitude de rejeição se traduz na convicção de que estamos transitando para um novo paradigma. O desejo de ruptura leva à convicção de que essa ruptura já ocorreu, ou está em vias de ocorrer (…). O pós-moderno é muito mais a fadiga crepuscular de uma época que parece extinguir-se ingloriosamente que o hino de júbilo de amanhãs que despontam. À consciência pós-moderna não corresponde uma realidade pós-moderna. Nesse sentido, ela é um simples mal-estar da modernidade, um sonho da modernidade. É literalmente, falsa consciência, porque consciência de uma ruptura que não houve, ao mesmo tempo, é também consciência verdadeira, porque alude, de algum modo, às deformações da modernidade”.
Ainda segundo Rouanet, o sujeito pós-moderno é psicopatológico. Em termos de patologia social, a modernidade fez surgir coisas contraditórias como indústrias e a atitude liberal, a ciência, a tecnologia, a multiplicação da população pobre e de guerras racionais. A pós-modernidade marca o declínio da Lei-do-Pai, cujo efeito mais imediato no social é a anomia, onde a perversão se vê livre para se manifestar em diversas formas, como na violência urbana, no terrorismo, nas guerras ideologicamente consideradas “justas”, “limpas” ou “cirúrgicas”. A razão cínica é cada vez mais instrumentalizada. Isto é, não basta ser transgressivo, ou perverso-imoral, é preciso se construir uma justificativa “moral” para atos imorais ou perversos. Zizek (2004) cita o escabroso caso dos necrófilos, nos EUA, que se julgam no “direito” de fazer sexo com cadáveres. Ou seja, qualquer cadáver é “um potencial parceiro sexual ideal de sujeitos ‘tolerantes’ que tentam evitar toda e qualquer forma de molestamento: por definição, não há como molestar um cadáver”.
Na pós-modernidade a perversão e o estresse são sintomas resultados da falta-de-lei, da falta-de-tempo, e da falta-de-perspectiva de futuro, porque tudo se desmoronou (do muro de Berlin à crença nos valores e na esperança). “Tudo se tornou demasiadamente próximo, promíscuo, sem limites, deixando-se penetrar por todos os poros e orifícios”, diz Zizek.
No mundo pós-moderno o homem não se senta passivamente de braços cruzados e recebe conhecimento; antes, a interpretação do homem É a realidade. Essa confusão de objeto e assunto rotula o pós-modernismo de niilista e relativista. Nessa ótica nada é absoluto. Lógica, ciência, história, moralidade são meros produtos da experiência e interpretação individual. Pense nisso quando ouvir alguém dizer: "Essa é a MINHA verdade!" ou "O que importa é como EU vejo", ou "o que é verdade pra você, pode não ser pra mim e vice-versa!"
Ok! Mas em termos cristãos – adventistas – quais os efeitos ESPIRITUAIS que a Pós-Modernidade trouxe à vida da igreja?
Antes que você, leitor, pós-moderno ou não, me acuse de dogmatizar uma questão complexa como essa, devo ser honesto: vou basear esse texto em minha própria experiência!
Não é fácil escrever sobre pós-modernidade em um contexto cristão – que dizer em um contexto adventista! Como você já percebeu, a cosmovisão pós-moderna rejeita verdades tidas como absolutas; o que, em um contexto secular, leva a tratar como toleráveis, socialmente aceitos – e até incentivados – padrões morais e sociais extremamente questionáveis. Seria possível que tal forma de pensar possa moldar o pensamento cristão do século XXI? Uma rápida releitura dos parágrafos anteriores mostra que tal mudança de atitude já ocorreu.
Quem seriam os cristãos adeptos da tatuagem como estilo de vida? Ou adeptos do uso de jóias? Quem seriam os que montam ringues de luta-livre dentro do templo de adoração?
Sendo que a pós-modernidade rompe com os valores absolutos, não posso deixar de tomar o texto paulino de Romanos 12:1 e 2 como antídoto preparado por Deus justamente para essa ocasião.
"Rogo-vos, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, que apresenteis os vossos corpos como sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional. E não vos conformeis com este presente século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimentais qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus."
Observe que o texto inspirado deixa claro que somente os que têm a mente renovada podem experimentar a ‘boa, agradável e perfeita vontade de Deus’. Uma paradinha no grego nos traz algumas jóias do pensamento de Paulo. Veja:
O verbo "conformar" aqui utilizado nos traz a idéia de tomar forma de algo. Como que encher uma forma de bolo com a massa. Assim, Paulo está dizendo que não permitamos nosso cérebro seja cheio de coisas que nada tem a ver com a eternidade (os "valores" pós-modernos?), de forma que ele se amolde às circunstâncias e às formas secularizadas de ver o mundo e a vida.
"Transformar", conforme usado nesse verso de Romanos é metamorfoomai, de onde vem o termo metamorfose – como a lagarta no casulo transformando-se (por metamorfose) em borboleta. O verbo aqui está na forma contínua, ou seja, Deus apela para que, "como a luz da aurora que vai brilhando até ser dia perfeito" (Provérbios 4:15), permitamos que o Espírito Santo nos conduza a uma cosmovisão mais bíblica e menos mundana. Todo esse processo nos permite experimentar, gradualmente, a boa, agradável e perfeita vontade de Deus!
Voltando à Pós-Modernidade e seu impacto na vida cristã, tiramos algumas conclusões:
- Cristãos pós-modernos nivelaram estilos de música baseados no silêncio (PRESUMIDO) das Escrituras sobre o tema e, desta forma, trouxeram todo tipo de aberração chamada musical ao culto hodierno.
- Cristãos pós-modernos armam ringue de luta-livre na igreja sob o álibi de que ‘é melhor perder sangue aqui que perder a vida para as drogas’
- É a pós-modernidade cristã que atropelou os conceitos de modéstia cristã baseando-os nos conceitos de moda contemporâneos.
- Foram os teólogos pós-modernos cristãos quem criaram o conceito de "pequenas igrejas grandes negócios" se valendo de toda sorte de manobras comerciais para sustentar o luxo e o espetáculo em detrimento de um culto pedagógico e centralizado na contemplação de Deus através do estudo das Escrituras.
- É a teologia pós-moderna que rejeita verdades basilares da fé cristã como o Sábado do sétimo dia, o sono do ser humano na morte – bem como, entre adventistas, os que rejeitam o Espírito de Profecia na obra de Ellen G. White, legando ou no todo ou em parte aquelas verdades ao tempo da escritora.
- É a cosmovisão pós-moderna que produz o "Ministério da palhaçada", do autógrafo no CD, do fã clube e da idolatria de seres humanos (cantores, pregadores, administradores…).
- É a cosmovisão pós-moderna quem moldou pregadores do evangelho em animadores de auditório, ouvintes reflexivos em massa de manobra e adoradores em consumidores!
- Mas como frisei no início, não posso nem quero dogmatizar a questão. Nem todos os pregadores se tornaram animadores de auditório. Nem todos os músicos são relativistas niilistas. Nem todas as igrejas são a porta de entrada de um parque de diversão. Nem todos os teólogos se venderam à conveniência social e cultural! O problema é a reação dos pós-modernos!
Há algum tempo, quando participava de acalorados debates virtuais acerca de questões que, indiretamente, diziam – e ainda dizem – respeito ao tema, lembro-me vividamente das reações. Não foram uma ou duas dúzias de vezes que os adjetivos ‘retrógrado’, ‘atrasado’, ‘fanático’ e etc., eram escritos na linha debaixo de minhas falas! Ou seja, no modo de reagir, os pós-modernos cristãos são tão fanáticos e apaixonados por suas posições relativistas como os adjetivos que ora dirigiam às vozes discordantes!
Esqueci do termo "maniqueísta"!
"Ai dos que chamam bem ao mal e mal ao bem! Que fazem da escuridão luz e da luz escuridão! (Isa 5:20)
O primeiro sintoma dos que deixam Jesus de lado como seu guia é a perda da noção do que é sagrado, depois dos princípios, valores e regras estabelecidas por Ele. Assim, abismo chama abismo (Salmos 42:7) e, tal qual uma engraçada analogia sobre o buraco, quanto mais tira (mais relegam a Deus), maior fica (o buraco espiritual e moral)!
Ter Deus como Guia da vida não significa uma vida alienada de tudo o que é atual ou moderno. O problema é a forma com a qual nos valemos dessas coisas. Cristãos não são seres infelizes que se ‘escondem atrás de um deus para dar sentido às suas vida e driblar sua covardia diante do desafio da vida’ – nas palavras de Dawkins.
Para a desgraça do pós-moderno é a sua própria consciência, governada pela fome de prazer e satisfação, quem rege a vida! Sobre a rejeição das orientações de Deus, a irmã White se expressou da seguinte forma:
"O plano de Satanás é enfraquecer a fé do povo de Deus nos Testemunhos. Em seguida vem o ceticismo no tocante aos pontos vitais de nossa fé, as colunas de nossa posição, depois as dúvidas acerca das Escrituras Sagradas, e então a caminhada descendente para a perdição. Quando os Testemunhos, nos quais se acreditava anteriormente, são postos em dúvida e rejeitados, Satanás sabe que as pessoas enganadas não pararão aí; e ele redobra os seus esforços até lançá-las em rebelião aberta, que se torne irremediável e termine em destruição." Testimonies, vol. 4, p. 211.
Neste texto a irmã White fala sobre os que têm posto duvidas sobre a obra do Espírito Santo por meio dos Testemunhos. Em seu tempo várias pessoas, dentro e fora da igreja, colocavam em dúvida a obra e os escritos dela. O livro "O Testemunho de Jesus", escrito por Francis McMillan Wilcox, editor da Review and Herald, periódico e editora adventista dos EUA, descreve algumas situações em que o Testemunho de Jesus foi colocado sob ataque e sempre se revelou obra de Deus.
No século XXI a obra de Ellen White permanece sob ataque dos céticos e cristãos pós-modernos. Pastores, líderes e administradores, cuja consciência – pervertida pelo pós-modernismo – sempre se deleita na crítica deletéria – entre os críticos existem os sinceramente desinformados – tem se mantido longe das orientações de Deus, permanecendo na trincheira de suas deduções e embalados por seus milhões doados pelos fiéis. Mas o que sempre me causa espanto é quando a crítica deletéria, a dúvida, a cavilação chega pelo lado de dentro!
"Quando homens se levantam, pretendendo ter uma mensagem de Deus, mas em vez de combaterem contra os principados e potestades, e os príncipes das trevas deste mundo, eles formam um falso esquadrão, virando as armas de guerra contra a igreja militante, tende medo deles. Não possuem as credenciais divinas. Deus não lhes deu tal responsabilidade no trabalho." Testemunhos Para Ministros e Obreiros Evangélicos; pp. 22 e 23
Pela distorção dos postulados divinos, pela relativização dos valores cristãos, morais e humanos, pelo fundamentalismo pós-moderno frente aos cristãos tradicionais, pela destruição da imagem cristã perante a sociedade secular, por tudo isso e muito mais: o pós-modernismo (disfarçado de cristão ou não) é uma praga!