Para não ser precoce, fiz questão de ouvir várias e várias vezes esta sinfonia. Mas sabe, hoje eu digo que ela me decepcionou. Talvez, ela só seja conhecida por causa do nome do autor. Parece que não foi feito direito, está mal acabada. Ela é cheia de um “improviso” marcante, sempre providenciando uma saída e uma nova entrada do tema; tema este que está sempre presente na música, do inicio ao fim. Assim, não tem prende, o enredo é ruim.
Não sei se foi uma interpretação muito ruim, sem vida e animo da orquestra. Mas você a ouve e não fica reparando muito, ela não te prende muito a atenção, se torna até um pouco chata. Pois muitas vezes parece que não anda, é meio sem sentido; as coisas ficam meio “sem nexo”. Você pensa: “Por que ele fez isso? Não tem nada a ver. Não precisava. Foi muito rápido. Pulou etapas.” E parece que há alguns anúncios e coisas mais “fortes” e encantadoras, como umas repentinas entradas dos metais no quarto movimento, que parecem serem colocados apenas para chamar a atenção, e para dar aqueles momentos fortes de metais (que é sempre comum nas obras do autor). Contudo, ela me pareceu muito gritada, alta; não se vê muito um dobrado, uma marcação, uma ênfase dos graves, tem hora que você se pergunta: “Onde estão os contra-baixos?”; não parece haver complexidade e calor, mas frio; mesmo, quando levado pela histeria em alguns pontos.
Mas chega de falar mal. O que mais me atrai é o tema, e como diversas vezes ele é tratado; tema qual é mostrado por aquelas 11, 12 notas, desde o primeiro movimento ao último. No primeiro, é algo mais escuro, sombrio, triste, fossa; mais duro e difícil (dando um pouco a cara da 4ª sinfonia). Mas cresce no decorrer da música. No segundo movimento há uma bela orquestração, algumas melodias trabalhadas de forma muito bela que até parece ser outra música – talvez, a parte mais bem trabalhada da música.
O que me impressiona são alguns particulares momentos, alguns trechos de 2 ou 3 minutos, ou menos do que isso, de forma como esse tema é trabalhado no quarto movimento. De certa modo, posso dizer que não gostei nem gosto da música. Mas Tchaikovsky, conseguiu expressar esse tema de forma tão grandiosa e expressiva, que se monstrou pequeno e incapacidade para tratar dele, e me faz lembrar um pouco a 9ª Sinfonia de Dvorak [no último movimento]. Esse tema trata uma idéia comum a todos os homens, que é aquela idéia da dificuldade, da pressão, da dúvida do tipo “Por que continuar a me sacrificar, insistir? Por que continuar a lutar assim pela a vida?” Lembra um pouco a quarta sinfonia, mas é paralelo. Traz muito aquele enfoque da tristeza, do desanimo, do desamparo, do se dar por derrotado; isso fica absurdamente claro no primeiro movimento. Mas essas notas terminam com um teor de insistência, de heroísmo, de virilidade, de não desistência – “Agüenta aí.”, “Mas continuo a insistir e viver.”, “Ainda insisto em não abaixar a cabeça.”. E isso vai crescendo durante a música até que chegamos no quarto movimento, e temos quase que um odre à alegria; tendo-se a certeza, o triunfo (quase que marcial) de que não irá se entregar a tristeza, a melancolia, ao abandono; mas pelo contrário, a situação e essas coisas são encaradas por um olhar heróico, determinista; é um comprometimento de “Vou parar de ficar chorando. Estou carregado de coragem e irei lutar com toda energia, vontade, forças, dignidade.” Estou tentando encontrar as palavras certas, mas é difícil, pois são expressões e termos, meio que nessa linha de sinônimos, mas que só consigo ler musicalmente, não encontro palavras no meu pobre vocabulário – talvez se fosse poeta.
Algo que vi na Internet, que talvez fale por si sobre esse tema, ocorreu na Inglaterra na II Guerra Mundial, em 1941. Não me recordo o nome da cidade e tal. Mas a população estava ficando fortemente abatida pelos males da guerra, então pediram para a orquestra tocar algo para elevar o ânimo dessas pessoas. E ai eles tocaram essa música, e dizem que durante o concerto a cidade começou a ser bombardeada. E ao invés de todos saírem correndo para se protegerem, continuaram até a última nota.
É um virtuosismo épico o tema no quarto movimento dessa música. Faz até lembrar dos 300 de Esparta, onde os 300 até riam das centenas de milhares de medo-persas, na passagem de Temópilas. Porém, foi um pouco frustrante como que encerrou a música. Foi o que falei no inicio, Tchaikovsky foi insulficiente, foi leviano, para compor essa música e tratar desse tema. Talvez, é a música onde se vê a fraqueza desse compositor extraordinário; tanto é que na 6ª Sinfonia ele muda totalmente; essa linha que vinha sendo desenvolvida desde a primeira, e mais claro na quarta e quinta. Talvez, quase que um fracasso; se não fosse por alguns pontos e momentos da música.
O que eu diria ter sido a grande falha, é que ficou com uma cara muito precoce e rápida, no sentido de apressada. E nisso parece que cortou um monte de partes, deixou de desenvolver mais a fundo, diminuir o tempo em alguns trechos e pensar muito em alguns pontos, ligar melhor as partes, dar um acabamento mais perfeito. Pois, apesar de ter em torno de 45 minutos, parece é que se está correndo para o final e para acabar logo; ai parece ver um filme todo cortado, mas tanto que as partes não mostram muita ligação e sentido. Talvez, Tchaikovsky tenha perdido a linha, ou a noção e idéia do que realmente fazer durante ela, e pensou assim: “Vamos preencher e terminar logo essa música.” Bem, mas se formos trabalhar a idéia de reter o bem, eu diria que essa música me marca muito, e que eu sempre penso, inclusive nela mesmo, é desse tema, de sua melodia, de suas 11 ou 12 notas; foram tais que salvaram essa música e que ainda nos fazem dizer: “Tchaikovsky apavora!” E o tema ecoa em nossas vidas, dizendo: “Ir avante, e com coragem. A dificuldade não é suficiente para te tragar.”