Dando continuidade ao tema do Perfeccionismo, agora o ponto a ser tratado é, no mínimo, estranho no livro de Dennis E. Priebe. Na verdade, ouvi uma palavra e ideia "teológica" que eu jamais imaginei que alguém pensaria em tal: Impecabilidade de Caráter do Homem.
Priebe, dentre outros, traçam um tecido com uma ideia de impecabilidade do homem. Ao olhar bem, percebe-se que este é 'o grande ponto' do Perfeccionismo. Não foi logo de início, mas em sua obra, Priebe, em alguns momentos coloca de forma muito ambígua esta ideia. Num momento diz que apenas Deus é, a priori, 100% impecável, ou seja, só Ele, de fato, possuí algum certo tipo de 'impecabilidade de verdade' - uma comparação no mínimo estranha, pois entraria no terreno especulativo sobre o próprio livre-arbítrio divino.
Ao ele fazer esta declaração - creio que sem notar - ele entra numa subjetividade muito vaga quanto ao que seria a ideia de impecabilidade fora da divindade. Segue alguns pontos a serem considerados:
- Se Deus é absolutamente impecável, a priori. Então Jesus também era. (Pois, segundo a Bíblia, Ele não utilizou de Sua Onipotência, Onisciência e Onipresença, mas nada se diz que Jesus abandonou a sua 'impecabilidade'.). Apesar de ser muito misterioso a encarnação de Jesus e não ser minha pretensão entender o que a Bíblia não revelou. Podemos assim concluir que Satanás, se enganou novamente em criar alguma hipótese em sua mente de que Jesus pudesse pecar como humano - absurdo tão quanto, quando Satanás imaginou que poderia derrotar Miguel no Céu, assim como quando se imaginou poder ser superior a Deus. Sem perceber, Priebe anunciou uma ideia do tipo aberração de 'um Deus que pode pecar' (mas que, o alivio de Priebe é dizer que 'Ele simplesmente não pecou. Por isso também podemos não pecar.').
- Jesus se declara impecável, a priori. [Sem possibilidade.] As Suas próprias palavras dão a ideia de Sua impecabilidade pura e plena ao perguntar: "Quem dentre vós me convence de pecado?" João 8:46.
- Isto é uma especulação quanto a natureza de Deus que também não faz sentido, uma vez que pecado é a transgressão das Leis de Deus. [Em alguns momentos Priebe também usa esta definição acrescentando a palavra/ideia 'escolha'.] Mas repare que a própria definição provoca uma pergunta: Isto não se aplica a Deus? Pois Ele é quem faz as próprias regras, a Lei. Mais do que isso, Ele é a Lei. Por fim é razoável que este tipo de ideia/comparação não se atribui a Deus - não faz sentido algum.
- Se Deus é o Único impecável, a priori. O conjunto complementar (ou seja, todos os seres criados por Deus) não são como Deus neste sentido. Logo, não faz sentido nenhum usar ou aplicar a palavra "impecabilidade" para um ser criado mas, tão somente, a palavra "pecabilidade". E veja que isto mudaria totalmente o eixo da conversa e construção teológica de Priebe se ele buscasse desenvolver e deixar claro quanto a 'pecabilidade do homem' ao invés de tentar inventar um tipo (?) de 'impecabilidade do homem' para qual ele mesmo diz que só Deus é, de fato, em absoluto, impecável.
- A ideia de impecabilidade está atrelada com a ideia de ausência do poder/capacidade de se escolher pelo pecado. Ou seja, como a conquista de uma 'mutação' no livre-arbítrio do índividuo que o impede de escolher pelo pecado, o que é no mínimo 'estranho' e 'absurdo'. A palavra impecabilidade é, por natureza, exagerada, extrema, chocante, impactante e, por si mesma, contradiz com as Escrituras. Pois, em toda a Bíblia, vemos escancarado - em cada página - a pecabilidade do homem e até mesmo de anjos. Por exemplo, Bíblia diz que Deus criou um Éden perfeito, e um homem e mulher perfeitos. E logo trás uma declaração sobre a perfeição deles que se destacava por ter a capacidade de escolher por pecar. Não encontramos um único texto na Bíblia que promove uma ideia de impecabilidade humana.
- Jesus ensinou explicitamente para todos os seus seguidores (ou seja, cristãos) o seguinte: "...tu, quando orares, entra no teu aposento e... E, orando, ... vós orareis assim: "Pai nosso, que estás nos céus, ...; perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós perdoamos nossos devedores" Mateus 6:6-12. As palavras de Jesus são bem explicitas em declarar claramente para os cristãos (de sua época, até os dias futuros) de que tais cometeriam pecados, e que ao orarem para Deus, deveriam pedir por perdão (e dos seus vários 'pecados' ao invés de 'pecado'; pois a estrutura da frase nos transmite até mesmo uma ideia de 'quantidade incontável' - incontáveis pecados.). Ao mesmo tempo, ao Jesus declarar explicitamente quanto a pecabilidade do homem (o oposto de qualquer ideia de impecabilidade) reparamos que em nenhum momento Ele fala isto de forma 'negativa' ou 'condenativa', como se fosse algo ruim, um problema. Antes, Jesus fala como tendo uma solução/remédio para um problema crônico. Jesus deixa claramente que Ele veio ao mundo buscar pelos pecadores, e a oração seria um remédio. A oração não impede o homem de pecar, mas salva/perdoa/cura o homem pecador.
- No meu ver, este amor demonstrado no ensino da oração de Jesus - que se pede por perdão - é a base da construção que Priebe deveria construir a sua teologia. E não no sentido oposto, de construir uma teologia em que o homem deve buscar 'chegar num patamar superior' em que não precisasse deste tipo de oração.
- Não há nenhum texto em toda a Bíblia que transmite a ideia para que os cristãos deixarem de orar assim em algum momento de sua vida/jornada espiritual após alcançar um certo tipo de status.
O que a Bíblia diz explicitamente?
A Bíblia deixa muito claro em 1 João 1:8-10:
8 Se dissermos que não temos pecado, enganamo-nos a nós mesmos, e não há verdade em nós.
9 Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados, e nos purificar de toda a injustiça.
10 Se dissermos que não pecamos [impecabilidade], fazemo-lo mentiroso, e a sua palavra não está em nós.
O texto de 1 Coríntios 10:12 também diz:
"Assim, aquele que julga estar firme, cuide-se para que não caia."
Ao combinar os dois textos (de João e Coríntios), a uma mesclagem óbvia da ideia de que mesmo uma pessoa que está firme continua a ser uma pessoa pecadora. É um pecador que necessita de Jesus. E não o contrário, o texto de Paulo não transmite a ideia de que uma pessoa só é firme na medida em que ela não peca mais; mas antes, por uma cosmovisão paulina, é você resistir, levantar, pedir perdão, levantar a cabeça, se agarrar a fé em Jesus e que Ele nos salva.
Paulo se autocorreconhecia como sendo o pior pecador do mundo (1 Timóteo 1:15-16), e não porque ele se autoenganava. E repare que na Bíblia ele se coloca assim 'no presente' e não apenas no passado, antes de ser alcançado por Jesus. E note ainda que no verso 12 ele diz "Dou graças a Cristo Jesus, nosso Senhor, que me deu forças e me considerou fiel, designando-me para o ministério." E Paulo diz isto, mesmo se autoreconhecido, que de fato, ele era um pecador (o pior). O mesmo encontramos durante toda a Bíblia, pessoas quem Deus considerava fiel, designando-as para um ministério ou ação específica, embora tais pessoas tivessem a mais profunda convicção de que 'não eram perfeitas'.
Estes textos é por demais explicito e deveria lançar por terra toda teologia perfeccionista que tenta construir uma ideia de impecabilidade do homem, um caráter impecável. Porém, há várias formas que os perfeccionistas tentam 'driblar' estes pontos.
O Contorno de Priebe
Como Priebe tenta driblar este ponto claramente conflitante? Priebe constrói a ideia sobre um 'autoconhecimento errado como sendo certo' como sendo a solução. Ele diz que o homem, em nenhum momento irá se considerar ou reconhecer como tendo alcançado o estado de caráter perfeito e impecável; o homem não irá reconhecer que não tem pecado mais. E sim que somente Deus irá saber e irá reconhecer isto. [Diferente de alguns outros perfeccionistas que declaram uma ideia de que o homem reconheceria de que nada mais lhe pode fazer pecar e que ao não se julgar ter cometido nenhum pecado durante o dia, não teria o que confessar e pedir perdão a Deus.]
Priebe desenvolve a seguinte ideia, num exemplo hipotético: O crente estará seguindo as palavras da carta de I João 1:8-10, pois não irá se declarar ao outro como 'não tendo pecado', nem tampouco se reconhecerá assim (justo aos próprios olhos). Logo, o indivíduo continuará a orar por perdão para Deus. Até aí, tudo bem, mas então vem o ponto problemático que Priebe acresceta: Nesta situação hipotética, Deus ouviria sua oração, mas não o perdoaria de nada, pois não teria pecado a ser perdoado; e o considera uma pessoa sem pecado; mais do que isso, Deus saberia que você jamais escolherá/praticará algum pecado; você se tornaria exatamente igual a Jesus "Quem me pode convencer de pecar?", mas que não reconheceria isto.
Desta forma Priebe contorna a ideia de que um justo jamais será justo aos próprios olhos.
As Implicações Absurdas do Contorno de Priebe
Ao fazer este malabarismo, Priebe entra num terreno ainda mais estranho. Cria-se um tipo perigoso de contradição. Pois se o fruto do Espírito Santo é o autoconhecimento; e o Espírito Santo é aquele que nos convence [faz reconhecer] do nosso pecado e estado de pecador. Ou seja, não é nós, por conta própria/independente. [João 16:8, Gálatas 5:22], então, Priebe, sem perceber, alega que Deus, o Espírito Santo é mentiroso, nos engana, ou, no mais absurdo, Ele brinca conosco fazendo-nos reconhecer ser algo que não somos. Aproximando com algumas características de deuses gregos que 'brincavam' com os homens.
Além disso, estaria criando um tipo de teologia de aparência de falsa impiedade. Ou seja, que há um certo tipo de 'glória' no homem se reconhecer como sendo ímpio, pecador; ainda que não o sendo. O que é um absurdo. A Bíblia nunca declara o 'reconhecimento como pecador' como algo glorioso (não faz sentido, seria absurdo haver glória no simples ato de olhar no espelho e dizer "Como sou pecador!"). Toda glória, se há alguma glória, os méritos são todos de Cristo e para Ele. A glória do 'reconhecimento como pecador' é quando Jesus trás isto a luz, quando Jesus 'nos faz reconhecer como pecador'. O que seria um absurdo, como vemos no parágrafo anterior, caso isto fosse mentira (pois, na verdade, seríamos 'perfeitos'). Jesus seria, no mínimo, sádico, nesta teologia. Além disso, a glória está no fato de apesar de pecador, Jesus vem até nós, e nos perdoa, limpa, transforma em filhos de Deus. Ou seja, o grande ponto é na revelação do perdão, da mudança de status, da ponte que Jesus faz entre o pecador e a glória do Céu imaculado, e da presença de Si, do presente da Salvação; do Seu Resgate que redime o pecador imperfeito. Todos estes aspectos, e os temas circundantes, perdem totalmente o sentido e relevância, se construirmos um conceito de impecabilidade.
Dennis Priebe poderia ter tentado usar mais uma carta na manga das premissas de sua teologia para tentar driblar e contornar isto. Priebe poderia dizer que continuaríamos a pedir perdão e nos reconheceríamos como pecadores devido a nossa natureza pecaminosa que ele diz que apenas será 'modificada' e 'eliminada' no Dia da Redenção. Fiquei perplexo pelo fato de não ter percebido ele usar este argumento no seu livro, pois aparentemente, seria o mais coerente e lógico (o melhor uso de suas premissas digamos assim). Não sei o motivo pelo qual não o fez. Porém, se o leitor pensar um pouco sobre, notará que se Priebe usasse tal, entraria num problema de referência circular; ou seja, um dos motivos para ele ter feito a separação entre natureza pecaminosa e caráter pecaminoso foi justamente no sentido de colocar que é com o nosso 'caráter pecaminoso' que nos cabe preocupar e reconhecer os pecados cometidos, e não a natureza pecaminosa em si e seus 'pecados incontroláveis'. Daí implica que não faria o menor sentido o Espírito Santo nos revelar ou trazer a tona um pecado que não faz parte do grupo 'caráter'; tão quão não faria sentido algum 'o pecado contra o Espírito Santo' [descrito como único sendo imperdoável pelas Escrituras] ser um pecado do grupo 'natureza do homem'. Especulo eu que, talvez Priebe, percebeu esta referência circular problemática e por isso não tentou usá-la. Todavia, se ele não fosse tão rigoroso assim, seria a melhor saída para tentar 'driblar' ou 'contornar', teria mais margem para enrolar sem mencionar estes problemas de tal visão.
Jesus como Placa de Sinalização e não como uma Ponte no Caminho e 'o' Caminho
A Teologia Perfeccionista de Priebe constrói muito a ideia de que Jesus veio ao mundo, sem nada de natureza divina ou que fosse sobre-humana, ou algo que pudesse ser distinto do homem que vive num mundo de pecado e carrega as consequências do pecado. Para tal teologia, isto é um ponto essencial para 'a teologia' deles validarem que Jesus serviria de Modelo para o homem pecador. O que cria um problema simples, que eles fogem e não buscam abordar. Quer dizer que antes de Jesus vir ao mundo, o homem não tinha nenhum caminho a seguir? Deus não podia servir de Modelo? Só haveria esperança para o homem se Jesus viesse com uma natureza, caráter, DNA, ... exclusivamente humano? Repare que este tipo de preocupação ou informação não encontrarmos em nenhuma profecia messiânica. Nem mesmo quanto aos apóstolos. O mais próximo disso são declarações no sentido que Jesus sofreu e passou por coisas e tentações que também passamos, que Ele venceu tais, para nos encorajarmos com isso, que Ele pode nos fazer vencedores. Mas não há a preocupação primordial dada ao parâmetro 'como ele exatamente era em termos humanos & divinos'.
A Teologia do Perfeccionismo se preocupa com um entendimento mais do que cru, literal e exagerado da ideia de que "o pecado é indesculpável"; seja quem for, seja você Adão e Eva antes do pecado, seja quem for a pessoa que for neste mundo e em qual situação que for neste mundo. Ou seja, pecado é indesculpável e ponto final. E ponto final. E esta é a tecla ser infinitamente tocada. Chegando ao extremo de criarem uma ideia de autocondenação e o papel de condenar os outros com esta ideia.
[Nota: Na visão de alguns que defendem esta teologia, para eles, a morte de Jesus, a Bíblia, a História da Redenção, tem por 'principal objetivo' atestar de que 'pecado é indesculpável'. O que é uma inversão de valores. Pois, o mais óbvio é a "religião". Isto é, Deus religando o homem pecador consigo. É Deus salvando. É Deus redimindo o pecador. E ao Deus fazer isto, Ele o faz sem defender de modo algum o pecado, sem dar qualquer justificativa para tal.]
Daí, ao minimizar assim o entendimento do papel de Cristo em nossa vida. Os perfeccionistas entendem que o principal papel de Jesus é a ideia de um tipo de testemunho, ou Modelo (como eles costumam dizer), no sentido que cabe o homem tão somente imitá-Lo, isto é, escolher não pecar. Sendo que, na Bíblia, não vemos isto - não assim, não desta forma e modo enfase. Não vemos isto nos Evangelhos. Vemos Jesus, por exemplo pessoal, 'indo até o homem'. É o Emanuel, Deus Conosco. Jesus não foi o era um mero modelo. Ele era Emanuel! (tão somente esta ideia, não caberia nas páginas de Priebe). Jesus não era meramente o caminho no sentido de 'placas sinalizadoras' dizendo vire a esquerda, seguir reto, qual velocidade andar (um Jesus informativo, ou Jesus 'Manual de Instruções') e dizendo "Eu segui o caminho sem errar, você também pode, você deve.". O que melhor encontramos nos Evangelhos é Jesus se impõe como sendo 'o Caminho'. Jesus era 'o caminho' em que as placas de informações estavam colocadas; Jesus era o chão da estrada, o asfalto, Jesus era a ponte que ligava o homem com o Céu. Jesus era, em Si, 'o caminho da obediência'. Jesus era o 'todo', o pacote completo, e não apenas um modelo/exemplo para inspiração e motivação. Não há obediência fora de Cristo. Não me faz sentido idealizar qualquer ruptura/distinção em dizer "É nós copiamos Jesus (o Modelo)" ao invés de dizer que Ele é o 'caminho da obediência' a ser seguido. Há uma sutileza antropocêntrica x cristocêntrica aqui.
A Bíblia não apresenta 'o pecar' como algo indesculpável custe o que custar (mesmo sem ajuda de Deus)
Logo no início de Gênesis vemos em Gênesis 2, que o homem precisava de uma companhia auxiliando-o. Ellen G. White vai além. Ela declara que o homem não deveria se aproximar da Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal, nem se afastar de sua mulher. Ela também que Deus enviou anjos especialmente para orientar o casal quanto a queda de Satanás, seus planos malignos na Terra, alertando ainda mais o casal para não serem pegos de surpresa. Intervenções divinas que certamente não seriam necessárias caso o homem não necessitasse delas na vitória contra o mal.
A própria Bíblia diz que só resistimos a tentação porque Ele intervém. Deus só permite que nos sobrevenha tentação na medida que nos seja possível resistir. [E, o mais intrigante, é que Jesus diz para orarmos por isto - "não nos deixe cair em tentação". Como se houvesse ainda maior necessidade de intervenção. Por quê?] Esta simples ideia (verso) é simples em sua implicação: "Logo, se vier maior tentação que podemos resistir pecamos." Ou seja, há causa, razão, explicação, para se pecar se não fosse a intervenção de Deus. Há uma guerra, e Satanás certamente quer sair vitorioso custe o que custar. E isto está acima da mera escolha humana (o que vimos em outro texto), qual Priebe tenta recorrer a ideia de separar o pecado em natureza pecaminosa que é herdada e em caráter pecaminoso que podemos escolher no dia-dia).
Os textos abaixo deixam bem claro a ideia
- "Eu nasci na iniquidade, e em pecado me concebeu minha mãe" (Sl 51:5)
- "Portanto, assim como por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado a morte, assim também a morte passou a todos os homens porque todos pecaram" (Rm 5:12)
- "Por uma só ofensa veio o juízo sobre todos os homens para condenação" (Rm 5:18)
Outro exemplo claro são as crianças que podem ser induzidas a cometer pecado (por ingenuidade, excesso de confiança no homem). E Jesus declara a mais terrível condenação - de toda a Bíblia - para os levarem uma criança a pecar.
Um texto chave para entendermos melhor a maravilhosa graça de Deus é o que se encontra no capítulo 2 de Efésios:
1 E vos vivificou, estando vós mortos em ofensas e pecados,
2 Em que noutro tempo andastes segundo o curso deste mundo, segundo o príncipe das potestades do ar, do espírito que agora opera nos filhos da desobediência;
3 Entre os quais todos nós também antes andávamos nos desejos da nossa carne, fazendo a vontade da carne e dos pensamentos; e éramos por natureza filhos da ira, como os outros também.
4 Mas Deus, que é riquíssimo em misericórdia, pelo seu muito amor com que nos amou,
5 Estando nós ainda mortos em nossas ofensas, nos vivificou juntamente com Cristo (pela graça sois salvos),
6 E nos ressuscitou juntamente com ele e nos fez assentar nos lugares celestiais, em Cristo Jesus;
7 Para mostrar nos séculos vindouros as abundantes riquezas da sua graça pela sua benignidade para conosco em Cristo Jesus.
8 Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus.
9 Não vem das obras, para que ninguém se glorie;
10 Porque somos feitura sua, criados em Cristo Jesus para as boas obras, as quais Deus preparou para que andássemos nelas.
Há alguns aspectos que este texto acima deixa claro. Não fosse a ação e intervenção de Deus, nós estaríamos/continuaríamos "mortos em ofensas e pecados".. Ou seja, não é questão de ter 'desculpa' para pecar, ou 'desculpar' um pecado. O ponto é que o homem estaria 'morto' no pecado. Haveria capacidade genuína de escolha e livre-arbítrio num 'morto'? Outro ponto que deixa muito forte o texto acima é que nós, o homem, eu e você, não fizemos absolutamente NADA, foi Jesus Cristo, que veio, interveio, e nos vivificou. O texto enfatiza, somos salvos pela graça. E isto seria de uma riqueza incompreensível. Note também que ao Cristo nos vivificar, Ele nos faz "assentar nos lugares celestiais" (v.6). E isto independente do nível de obediência do home, ou se seu caráter é impecável ou não. O v.10 diz claramente que tudo foi feito, criado, preparado (inclusive o caminho, as obras) pela divindade. É sempre a ação divina salvando o homem. E nunca, nada, não há nada que o homem possa fazer, nenhuma obra, que possa promover algum tipo de salvação [v.8-9]. Não existe nenhum tipo de meritocracia humana na Salvação. Todos os méritos são de Deus.
Dennis Priebe se confronta com este ponto da salvação pela graça de Jesus, e tenta criar um contorno. Para ele, os méritos são de Cristo, porque ele nos tira da condição inicial (C0), e então na condição recebendo a graça (C1), Ele nos dá o poder para obedecer. Dái, para Priebe, a salvação é 'operada' por nós ao exercemos este poder. E isto ocorrerá até um dia X, em nós que devemos ter alcançado uma condição C2 onde as coisas mudariam um pouco. E, se em C2, ainda estivermos como C1, então não seremos salvos. Em outras palavras, a ideia que Priebe constrói é que na prática, o que tão somente vemos e podemos fazer é a nossa 'operação/atuação na salvação' (obediência), mas que é para termos meramente num nível 'intelectual', ou 'na consciência', que é Cristo que está agindo e salvando, conforme obedecemos. Além disso, Priebe também justifica esta sua teologia como ela exaltando a Cristo (nossa obediência em si o exalta e adora). Mas no texto de Efésios acima, especialmente no v.7 temas a ideia clara que é Deus quem irá mostrar as riquezas da Sua graça - e isto independente da obediência do homem. O que o profeta Isaías deixa bem claro que não há mérito algum na obediência e obras humanas e, novamente, Isaías também considerando como Deus sendo o 'todo', nós somos meros barros nas mãos do oleiro. Não há nada o que o barro possa fazer para a própria salvação; tão somente o Oleiro.
5 Saíste ao encontro daquele que se alegrava e praticava justiça e dos que se lembram de ti nos teus caminhos; eis que te iraste, porque pecamos; neles há eternidade, para que sejamos salvos?
6 Mas todos nós somos como o imundo, e todas as nossas justiças como trapo da imundícia; e todos nós murchamos como a folha, e as nossas iniqüidades como um vento nos arrebatam.
7 E já ninguém há que invoque o teu nome, que se desperte, e te detenhas; porque escondes de nós o teu rosto, e nos fazes derreter, por causa das nossas iniqüidades.
8 Mas agora, ó Senhor, tu és nosso Pai; nós o barro e tu o nosso oleiro; e todos nós a obra das tuas mãos.
Neste texto de Isaías 64, também vemos a declaração clara de Isaías também se considerando um homem pecador. E nada, absolutamente nada, que evoque a mais resquicial ideia de impecabilidade do homem, ou caráter perfeito segundo a teologia perfeccionista de Priebe.
Este é um assunto que precisamos estudar mais a fundo e com cautela, para evitar que incorra de cairmos em perigosos extremos do nosso entendimento. Por exemplo, Bíblia, por vezes, declara não haver pecado ou estado irreversível para Deus, não há pecador que Deus não possa salvar (Isa. 59, Salmos 104) e, por outro lado, a Bíblia diz que há 'pecado imperdoável'. (Marcos 3:28-30) Contradição? Não. Antes a necessidade de um entendimento mais amplo. Quanto a isto, apenas para aguçar os pensamentos, deixo a máxima: "Jamais devemos procurar defender ou explicar um pecado. Tão quão jamais devemos deixar de procurar defender ou explicar as boas-novas para um pecador."
E a história de Jó e Enoque?
Os perfeccionistas alegam que Jó foi o exemplo do ideal perfeccionista. Porém, entender a história de Jó e o período em que ele viveu sob as tentações cruéis de Satanás sem a intervenção de Deus é um grande erro. A Bíblia, por vezes, nos fala da Guerra Espiritual, há anjos intervindo. Há anjos acampados ao lado dos que buscam a Deus. Também havia anjos do Senhor protegendo Jó. Jó não foi deixado como Jesus na Cruz que exclamou, a verdadeira e única declaração do tipo: "Deus meu, por que me abandonaste?". O pleno abandono da divindade, Jó - como qualquer outro - não teria suportado. (Nem Jesus suportou, e morreu.) A separação e abandono pleno e total de Deus é a ausência de vida no mínimo. No Céu, vemos claramente Deus intervindo, limitando até onde Satanás poderia ou não agir (veja que as limitações foram diferentes em tempos diferentes). Deus, provavelmente, tocara no coração de amigos para ir consolá-lo. (Mesmo que, após a semana de silêncio, não foram felizes nisto.). No fim, o próprio Deus 'se apresenta' para Jó (novamente uma intervenção das mais incomuns) e coloca a cabeça dele no lugar devido. Além disso, Jó reconheceu que era pecador, que cometeu equívocos e que falou equivocadamente. [Ver Jó 40:3-5; 42:3-6] Mas nisto, vemos também a graça e o perdão de Deus, pois Deus não creditou pecado em Jó.
Se não conseguimos ver a Graça, o Perdão, e o Plano da Salvação na vida de Jó, há algo de errado. E, se pior ainda, dizermos ou acharmos que Jó era um modelo equivalente ao de Jesus, no quesito impecabilidade, então há uma tremenda cegueira espiritual, para qual devemos repensar. A Bíblia declara de que o justo viverá pela fé. Hebreus 11 nos trás diversos exemplos dos pais da fé, e Jó não está lá. Mas Noé, que pecou após "a Porta da Graça" (para o Dilúvio) ter sido "fechada), está entre os heróis desta lista.
Jesus Cristo foi o único Cordeiro 100% imaculado, sem culpa, perfeito, impecável. Caso Jó, ou Enoque tivesse estas atribuições, eles poderiam ter tomado o papel de Cristo pela Expiação dos pecados.
Pouco a Bíblia fala sobre Enoque. Já Ellen G. White dedica um dos mais maravilhosos capítulos do livro Patriarcas e Profetas para falar do homem pré-diluviano que foi arrebatado. Alguns perfeccionista divulgam a ideia de que Enoque, por sua obediência irrepreensível, por andar com Deus, 'conquistou o direito de ser arrebatado e ir para o Céu'. O que não faz sentido. A implicação dessa meritocracia é simples: Enoque não precisou que Jesus morresse futuramente? Além disso, em geral, os perfeccionistas acreditam que todos os rituais do templo para expiação dos pecados, dentre outros, eram simbólicos. Somente se Jesus cumprisse o verdadeiro sacrifício e depois expiasse no Santuário Celestial é que tais pessoas seriam de fato, a rigor, perdoadas. E, se Jesus, não morresse, bem, as esperanças se extinguiriam. Ou seja, e Enoque, ele foi arrebatado e estava no Céu mesmo antes de Jesus derramar seu sangue e fizesse a expiação de seus pecados. E Moisés? E Elias? - Pense nisso e verás que brotará diversas perguntas e implicações estranhas, absurdas, com a ideia de que aqueles que foram arrebatados para o Céu estavam 100% perfeitos, impecáveis; ou que houve algum mérito por parte da obediência deles.
O pensamento que pode nos proteger do legalismo perfeccionista ao estudarmos a Bíblia é termos em mente que a Bíblia não diz o que o homem pode fazer se buscar a Deus, mas em como Deus busca o homem, como Deus pode promover uma vida de obediência no homem, como Deus pode transformar o homem, como Deus pode colocar o desejo no homem de buscá-Lo. Com o "como" no sentido muito mais dos testemunhos do que uma explicação descritiva.
Por fim
Há outros pontos envolvidos aqui a ser abordado nos próximos estudos. Leia atentamente os textos abaixo, para refletir e pensar quanto a coerência ou incoerência das ideias perfeccionistas de Dennis Priebe com o Espírito de Profecia:
"Muito homem brinca com o mal, julgando que o pode deixar quando lhe aprouver; mas é engodado mais e mais, até que se encontra dominado por uma vontade mais forte que a sua própria. Não pode escapar ao seu misterioso poder. [A pessoa nessa condição poderia de alguma maneira 'escolher' não pecar?]* Pecado secreto ou paixão dominante o pode reter cativo, tão impotente como se achava o endemoninhado de Cafarnaum.
Todavia, sua condição não é desesperadora. Deus não domina nossa mente sem nosso consentimento; mas toda pessoa é livre para escolher o poder que deseja domine sobre ela. Ninguém caiu tão baixo, ninguém há tão vil, que não possa encontrar libertação em Cristo. [Jesus é quem liberta. E o pecado contra o Espírito Santo?] O endemoninhado, em lugar de oração, não podia proferir senão as palavras de Satanás; porém, o silencioso apelo do seu coração foi ouvido. Nenhum grito de uma alma em necessidade, mesmo sem ser enunciado em palavras, será desatendido. Os que concordam em entrar em concerto com Deus não são deixados entregues ao poder de Satanás ou à enfermidade de sua própria natureza." (Ciencia do Bom Viver, 93)
*Há homens que caíram nesta condição. Jesus não caiu. Jesus passou pela mesma tentação que uma pessoa passou nesta condição?
"Ao contemplarmos a encarnação de Cristo, sentimo-nos desconcertados diante de um insondável mistério que a mente humana é incapaz de compreender. Quanto mais refletimos sobre isto, mais surpreendente nos parece o tema. Quão imenso é o contraste entre a divindade de Cristo e a indefesa criancinha na manjedoura de Belém! Como entender a distância entre o poderoso Deus e a desajudada criança? Pois ainda assim o Criador dos mundos, Aquele em quem habitava a plenitude da divindade, manifestou-Se como indefeso bebê na manjedoura. Mais excelso que qualquer dos anjos, igual ao Pai em dignidade e glória, vestido agora do manto da humanidade! Divindade e humanidade combinaram-se misteriosamente, pois o homem e Deus tornaram-se um. É nessa união que encontramos a esperança para nossa decaída raça."* Signs of the Times, 30 de julho de 1896."(A Verdade Sobre os Anjos, 154)
* Diante de tudo o que já foi estudado, com base neste texto acima de Ellen G. White, vemos claramente que Jesus Cristo não poderia ser como um mero homem 'pós-lapsariano', um comum humano após a queda. Jesus não foi apenas um 'Modelo' a ser copiado. Jesus era uma combinação 'misteriosa' de homem e Deus, num só. E isto é mistério. Tentativas de explicar ou adaptar como Dennis Priebe faz, pode criar diversas aberrações. Mas mais do que isso, o Cordeiro de Deus, precisava ser Deus e Homem como um só. Jesus não veio ser nosso mero Modelo - pois o Modelo sempre existiu, mesmo para Adão e Eva -, Jesus veio ser nosso Salvador, Vivificador, Transformador, Justificador, Perdoador, Transformador, Transladoador, Redentor, etc. Jesus é tudo. Jesus é a única esperança. Esqueça do homem.
Próximos estudos:
- Introdução: Uma História; [Ver]
- A Natureza Pecaminosa [Ver];
- Caráter Perfeito [Ver];
- impecabilidade do homem [este]
- perfeição plena antes do fechamento da Porta da Graça;
- definições de palavras/ideias (pecado, dentre outros);
- Ellen G. White e os 'outros textos esquecidos' sobre isso;
- natureza e vida de Jesus;
- >> Caso Encerrado [Ver].