Este é um momento histórico para o Brasil. Em meus 27 anos eu só recordo de ter visto algo parecido quando foi Impeachment de Fernando Collor, em 1992, com os meus 6 ou 7 anos de idade, não entendia o que acontecia. Desde então, nunca mais vi nada parecido. Bem, parecido até que via, eram as festas de Carnavais e Futebol, o circo, a festança brasileira que movimentava tantas pessoas. Ainda mais semelhante, foram as recentes passeatas de movimentos de grupos em prol de 'opções sexuais' diferentes de hétero (GLS). E não posso deixar de comentar este momento histórico que certamente será estudado e estará nos livros de História daqui em diante.
Deixo de expressar aqui o que eu penso sobre tudo isso, talvez, tema para um futuro livro, mas tento, como brasileiro que vivo este momento, registrar o que se passa.
De "Saco Cheio"
Talvez por ter mais consciência das coisas a partir dos meus 18 anos, mas desde então, nos últimos 10 anos foi extremamente crescente de forma exponencial a revolta de cada cidadão brasileiro para com o Governo. Mas quando digo cidadão, não digo qualquer cidadão. O Brasil é um divisor de águas, de fortes desigualdades sociais, um paraíso para os ricos, e um terror para os pobres. A Classe Baixa é a que mais sofre. Sofre pelas péssimas escolas públicas, que parecem esgotos, locais onde os filhos aprendem sobre pornografia, drogas, desrespeito e a cultuar o Circo brasileiro, isto é, o futebol, as novelas, os funks, o carnaval; sofre também pelo péssimo Sistema de Saúde Público, onde falta recursos, onde há uma má distribuição de hospitais e corpo médico, além de falta de instrumentos, onde pessoas precisam marcar consultas e exames com meses de espera; sofre pelo péssimo acesso da casa - normalmente na periferia - aos principais centros comerciais, trabalho e serviços; e juntamente com isso, o baixo salário minimo frente ao custo de ser um brasileiro, tornando difícil de ter uma ascensão social.
A classe média baixa e média é outra classe que sofre muito. São de certa forma o motor do trabalho técnico, empresarial do Brasil. Pessoas geralmente com uma formação um pouco mais sólida mas de vida sofrida. Brasileiros que trabalham muito. Perdem muito tempo encarando o percurso casa-trabalho. Estudam muito, pagando com dificuldade o ensino superior. E que, ao mesmo tempo, qualquer coisa que queiram adquirir para melhorar sua situação de vida, seja um carro, seja uma casa, seja um plano de saúde, são tudo caríssimos e de péssima qualidade. Ao mesmo tempo, são aqueles que mais pagam impostos, veem grande parte de seus salários formais sendo usados apenas para pagar serviços e impostos, mas sem ver um retorno do governo.
Ambas as classes possuem muito em comum. Talvez os dois itens mais fortemente comuns é o péssimo transporte. Se de carro, a falta de infra-estrutura e inteligencia viária e ruas esburacadas, fazendo que além dos estressantes longos transito todos os dias, tem também um alto custo com manutenção. Se de trem, metro ou onibus é preciso lidar com um super desconforto da lotação e infra-estrutura também ruim tornando as viagens longas, cansativas, estressantes. Fazendo com que muitos desses, percam 2, 3, 4, até mesmo 5 horas do dia apenas se locomovendo. E em meio a tudo isso, apenas veem os custos aumentando, mas não a qualidade. Outro forte item, é que cresceu a total descrença nos politicos e empresários desta nação. Ambos são símbolos de tudo o que há de mais ruim neste pais. São simbolos de ladrões da pior especie, de exploradores, de pessoas que, diferente dos demais, tem todos os confortos e comodidades, e ainda por cima, sonegam impostos, praticam atos de corrupção em beneficio próprio. Ambas as classes viram o salário desses - que já eram muito elevados - mais do que duplicar. Assistiram governo pós governo a mesma situação acontecer. Mesmo quando a Esquerda (o PT)assumiu o poder por 3 mandados seguidos, os problemas continuaram, e a corrupção, impunidade apenas pareceram crescer. Eram bilhões que sumiam, e o povo não via 1 centavo, nenhum beneficio retornado, nenhuma melhoria.
Esta era a terrível situação, um povo cada vez mais desacreditado no país, e desacreditado em si mesmo. Acima de tudo, o brasileiro não acreditava no brasileiro. Nação que traumatizou o povo a não ser ouvido, a ser taxado de palhaço, a perder a auto-estima. Todos estavam de saco cheio das injustiças e dos absurdos administrativos deste país que era apenas um paraíso para os ricos, os filhinhos de papai, os familiares de políticos. O povo que perdeu as esperanças e confianças nos partidos, não havia mais quem o representasse. E ao mesmo tempo, com um nó na garganta, não sabia com qual armas lutar.
20 Centavos - O Estopim
Apesar do reajuste abaixo da inflação. O anuncio de aumento de R$ 3,00 para R$ 3,20 do prefeito Haddad levantou a indignação deste povo. Povo inconformado mas acostumado a ter que pagar a exploração. Junto com isso o Governo apostou demais na Politica do Pão e Circo investindo ou melhor dizendo, gastando, bilhões com a construção de estádios de futebol e parques olimpicos para a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016, obras quais também todos sabiam que no fundo foram obras superfaturadas, apenas uma faixada para muitos se enriquecerem pesadamente as custas do povo, e, ao mesmo tempo, oferecendo este fortemente entretenimento de forma a acalentar e anestesiar ainda mais este povo que para tudo por um Carnaval e final de campeonato de futebol.
Em São Paulo, o centro das atenções, o motor do Brasil, há poucos meses houve fortes protestos com a Educação, sobretudo com os moribundos salários do Professor, quais são considerados (unanime) figuras muito mais veneráveis do que políticos e deputados, mas que ganham nem 10% do que um ganha. A manifestação, como a maioria, aconteceu no principal ponto da cidade, a Avenida Paulista, mas que foi violentamente reprimida pela policia. E a imagem de 'um professor apanhando por pedir um salário mais digno e melhores condições de ensino' aumentou ainda mais o senso de revolta.
No começo de Junho, um pequeno grupo começou um protesto contra o aumento do preço da passagem na cidade. Porém, era, em maioria, um protesto partidário que continha a imagem de pessoas que se sentem 'os revolucionários' ou algum tipo de modernos socilistas, comunistas, marxistas, e essas coisas. Inclusive, pessoas que carregavam muito a idéia de militantes que também lutavam em prol da Legalização da Maconha. Pessoas muito identificadas por alguns partidos mais radicais e esquerdistas como o PSTU, PCO e PSOL, entre outros, por alguns vistos como "estudantes dos cursos de humanas da USP e outros" quais possuem historicamente esta característica, sempre duvidosa, e que soa perturbadora e redundante; sobretudo, por ser muito partidária. E como foi dito anteriormente, o povo estava de saco cheio de partidos, figuras e discursos políticos, sobretudo desses revolucionários, muitas vezes utópicos, com discursos e propostas que pareciam ignorar todo o contexto politico-econômico, mas que acima de tudo, colocavam seus ideais sociais inspirados em livros de pensadores revolucionários, muito parecido com outros movimentos que ocorriam no mundo.
Em junho, especialmente na terça-feira, dia 11 de Junho, o movimento foi muito caracterizado pelo vandalismo, agressão à policia e destruição, deste pequeno grupo com caráter de partidos e ideais revolucionários esquerdistas. Quais queimaram sua imagem. O governo e o prefeito se recusou a negociar com tais. A mídia lidou de forma negativa com os atos que apenas causaram transtorno.
A Violência da Policia
Todavia, alguns dias depois, um novo protesto, com inicio no Teatro Municipal de São Paulo, o grupo se conscientizou mais no sentido da pacificação. A TV fez uma grande cobertura. E desta vez ficou fortemente evidente, com terríveis imagens, que a manifestação prosseguia pacificação, em torno de 5 - 10 mil pessoas, mas a policia, sobretudo a Tropa de Choque agiu com violência contra manifestantes, contra quem não manifestava, contra jornalistas com cassetetes, balas de borracha, bombas de efeito moral, spray de pimenta. Neste momento, um sentimento de revolta tomou conta nos brasileiros (graças a Mídia que mostrou e entonou tudo isso), o sentimento de ser agredido, o sentimento de serem tratados como animais pelo Poder, o sentimento de serem proibidos de protestar, de se manifestar, de por para fora sua revolta contra tudo, contra o Governo. Além disso, houveram prisões aleatórios com abuso de poder alegando "formação de quadrilha" e "porte de vinagre", fazendo com que alguns chamasse também de Revolução do Vinagre, apreendido pela policia por diminuir os efeitos das bombas de efeito moral.
O Manifesto nas Redes Sociais
No fim de semana, nas redes sociais, Facebook e Twitter centenas de milhares de pessoas se manifestaram contra. E houve um fenômeno. Sem partidos, sem um objetivo claro. Os 20 Centavos de aumento se tornou uma representação do Saco Cheio do brasileiro. Sem ideais de esquerda, sem aliança à partidos, candidatos, idéias revolucionárias, sem nem mesmo um projeto do que se deveria fazer. Centenas de milhares de pessoas marcaram, através dessas redes sociais, de se encontrar e se manifestar e de maneira totalmente pacifica. O Saco Explodiu e eles queriam fazer suas vozes ouvidas, queriam se sentir cidadãos, queriam de algum modo dizer que estavam vivos e que tinham algum poder, algum direito, queriam se manifestar. Era o nó na garganta querendo sair.
"O Gigante Acordou"
Dia 17 de Junho, o dia que ficou marcado. Dezenas de milhares de pessoas de forma totalmente pacifica, tomaram alguns dos principais pontos de São Paulo. A Av. Faria Lima, a Rebouças, a Marginal Pinheiros entre outros, e, como sempre, a Paulista. O Manifesto que parecia resgatar os sentimentos Nacionalistas do cidadão brasileiro, trouxe à todos a esperança de que realmente podiam obrigar, de alguma forma, o Poder (o Governo) fazerem algo em prol da população. Algo que se via fazer na Europa e no Oriente Médio, mas não no Brasil. Isso não fazia parte da História desta Geração. E as vozes foram ouvidas. As redes sociais foram tomadas pelo protesto, inclusive a mídia e jornais. Os governos, inclusive o prefeito Haddad voltou atrás a negociação. Mas não apenas em São Paulo, o manifesto se espalhou por diversas capitais e cidades do Brasil, em especial Brasilia onde o Centro Politico da Nação foi tomado por manifestantes, e também em Belo Horizonte e no Rio de Janeiro onde tiveram conflitos mais violentos. E no dia seguinte, 18 de janeiro, muitas cidades do país, como Porto Alegre, Recife entre outros, tiveram o preço de suas passagens reduzidas.
No dia 18 o movimento continuou. Uma multidão de milhares de pessoas ocuparam a Praça do Patriarca onde fica a Prefeitura de São Paulo e alem da Praça da Sé, de forma pacifica. Por trabalhar ali do lado, após o expediente fui ver com meus próprios olhos o meio desta multidão. Era pacifico, muitos gritavam "Sem violência, sem vandalismo!" Percebi que a maioria ali aparentavam estudantes universitários da classe média, sem propagandas de partidos; a maioria ali encarava como algum tipo de Grande Festa; inclusive, era possível ver algumas pessoas paquerando; outras pessoas bebendo, mas os insóbrios estavam em menor número. O que mais me incomodava não era o barulho, mas o forte cheiro de vinagre, parecia que haviam quebrado garrafas de vinagre por ali e também muitos fumando e de forma proposital se via muitos fumando de maneira 'libertadora' jogando a fumaça na cara de todos, no meio da multidão, como se fosse uma manifestação também. E em número menor havia pessoas protestando contra a PEC 37 e contra a "Cura Gay". Me dirigi a Praça da Sé, e no caminho, encontrava ainda uma forte presença de estudantes, mas na Praça da Sé parecia haver um clima um pouco mais tenso, pude ver algumas pessoas com olhares mais raivosos e como se maquiavam segundas intenções. O que mais me assustava era uma participação minima da policia nesses pontos. Apenas vi 2 policiais numa base móvel na Praça do Patriarca. Diferente do efetivo da terça passada, onde haviam centenas de policiais.
O Dia 18 passou. Muito semelhante ao dia anterior, apesar de haver vandalismo e furtos, porém, uma multidão ainda maior foram as ruas de São Paulo, sobretudo a Paulista.
O Futuro
Quais serão os resultados disso? O que isso tudo vai significar? Haverá mudanças realmente efetivas na estrutura e politica do nosso país? Eu não sei e sou pouco crente nisso. Mas isto pelo menos despertou a prova social de que uma multidão pode fazer a ponta da piramide estremecer assim como na Revolução Burguesa, na Tomada da Bastilha. Além disso, outros temores suscitaram juntamente com isso: a inflação, a alta do dólar, a diminuição do investimento estrangeiro no país, dúvidas quanto se a Copa e as Olimpíadas realmente serão boas para nossa economia; os receios de um Brasil que pode entrar numa crise. O que será daqui para frente. Se manifestar tomando as ruas e cobrar do Governo se tornará um novo hábito brasileiro, ou se o Governo realmente atenderá de forma a mudar o Brasil de forma estrutural para atender esses pedidos... eu não sei. Tudo o que sei é que este dia ficará marcado na História do Brasil.
1 comentários:
certeza
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