07 julho 2020

O que minha mãe me ensinou

3 comentários
Dizem que um dos grandes CHOQUES da vida de um homem é quando se perde a mãe. Parafraseando um comentário que li sobre uma sinfonia de Bruckner: "Se isto não te faz mover, nada mais fará." Neste último sábado, 4 de julho de 2020, minha mãe descansou. E isto te move! (Você literalmente precisa reorganizar sua mente, quem você é, e o que fará da vida.) Após uma dura luta de 1 ano e 8 meses contra um cancer de estômago - diagnosticado já no estágio IV, com posterior metástase para o fígado, biles e o pâncreas. Porém, por maior que seja o luto e dor dessa trajédia, a tinta não é escura o suficiente para ocultar as obras que ela carregara nesses mais de 65 anos de vida. E aqui vai, como uma homenagem, uma simples recordação do que vivi e aprendi com minha mãe. Espero que você possa aprender um pouco também.

Minha mãe teve origem muito humilde, em uma simples fazenda próxima a cidade de Acerburgo e de Monte Santo - MG. Uma família bem pobrezinha (dos tempos da latrina no lado de fora casa e cama de palha). Por outro lado, uma família tremendamente viva em amor e trabalhadora. Ao todo, foram 9 filhos. Uma logo se foi (mal nascera), um morreu na adolescência com leucemia, demais ainda vivem: 3 irmãos e 3 irmãs.

Procurando uma chance e qualidade de vida melhor para a família, meu vô, Claudio, decide vir para São Paulo, posteriormente trazendo toda família. Consegue um trabalho simples, um terreninho em Santo André, onde constrói uma simples casa para abrigar uma família tão grande. Esta casa - ainda está de pé -, tornou-se como um Templo para a família. Nela, ainda hoje, todos nos reunimos. Nela, minha mãe teve seu último fôlego.

Minha mãe já era adolescente quando chegou em Santo André, onde completou seus estudos. Com MUITA luta, dificuldades da pobreza, meu avô e minha avó conseguiram cuidar dos filhos, mesmo com alguns deles dando 'muito trabalho'. Já minha mãe foi uma filha mais exemplar. Mais tarde, meus avós conheceram a mensagem da Volta de Jesus, a Grande Esperança, aceitando a fé Adventista do Sétimo Dia, passando-a para toda a família - mesmo alguns filhos não aceitando depois. Minha vó, praticamente aprendeu a ler sozinha tentando ler a Bíblia. De certo modo, esta família acabou sendo um grande alicerse da fé adventista da volta de Jesus em Santo André, pioneiros na construção e manutenção, até hoje, da pequena, simples e humilde Igreja Adventista de Vila Guaraciaba que fica na rua dos meus avós (apenas a 1 quarteirão da casa dos meus pais), onde passei grande parte da minha vida da minha infância.

Minha mãe cresceu. Tornou-se uma secretaria. Não aprendeu inglês, mas chegou a saber razoavelmente bem de francês. Foi uma pessoa muito trabalhadora - como cada um da minha família. Seu trabalho mais significativo foi trabalhar de secretária na Casa Publicadora Brasileira (uma editora de literatura cristã), quando situava-se em Santo André, no terreno em que, posteriormente, foi o famoso Mappin, e, que, hoje, Shopping ABC. Nesta jornada, conheceu meu pai e tiveram 2 filhos: meu irmão mais velho e eu. Deixou de trabalhar e passou a se dedicar ao lar e, sobretudo, com aos filhos. Crescemos ao lado de minha mãe. Eu, por mais tempo, pois, só fui sair de casa para valer, quando casei, aos 30 anos.

Neste tempo, aprendi MUITO com minha mãe. Rute, como se chamava, era uma pessoa muito mais de atitude do que de palavras. Uma pessoa de caráter forte, coerente, com claro discernimento e sabedoria - aquela do tipo que só a experiência de quem passou por muita situação dificil na vida promove. Uma pessoa que, geralmente, esperava o outro terminar de falar para então falar, após ponderar bem as palavras. Sempre procurava não incomodar ou decepcionar os outros, por vezes, agindo contragosto. Não tinha ensino superior, mas ninguém enrolava ela. E para ser sincero, era uma doutora em Educação (muito mais que os que conheci na FE-USP). Fazia verdadeiras obras de arte na cozinha; conhecia mais sobre saúde, hábitos saudáveis, do que muito médico por ai. Uma referência entre os vizinhos mais antigos do bairro. Bairro qual ela acompanhou a transformação de uma vasta área verde, tornar-se um aglomerado de casas, ruas e carros. Uma pessoa que sempre esteve à frente, na simples igreja, cuidando, na maioria das vezes, das crianças. A qual não perdia um culto. Ajudou a cuidar de vários sobrinhos e de uma neta, pela qual se derretia. Uma pessoa trabalhadora, que sempre buscou ajudar nas finanças do lar, fazendo trabalhos de corte e costura, cortinas, cuidando da casa de outros, até mesmo como babá e ajudou meu pai a administrar um pequeno negócio de decoração por um tempo.

Minha mãe era uma pessoa que frequentemente puxava a orelha dos filhos e dos irmãos para fazerem o que era certo. Para ela, era inadmissivel não completar algo que se comprometeu a fazer e, quando fizesse algo, tinha que ser não apenas bem feito, mas feito de coração. O capricho, por vezes, me parecia ser um exagero. Mas era pura sabedoria. Não fazer o certo era inadmissível para a minha mãe, o que, algumas vezes irritava aqueles que queriam persistir em atitudes egoístas, erradas, tentavam discutir (mesmo sabendo estarem errados). Assim como era o valor da honestidade. Tinha que ser honesto e ponto final. Não se discute. Se algo tirava o sono da minha mãe, além da preocupação com os filhos, era o pensamento de que ela estava devendo algo para alguém. Mentira, para minha mãe, era como um tiro no peito. Por mais que a verdade pudesse doer, era comum ela cobrar quando percebia que havia mais coisa escondida na história, mesmo que para poupá-la: "Fala a verdade."

Ela, logo cedo, aprendeu muitos princípios de vida saudável, especialmente no que tange a alimentação. Me ensinou, desde pequeno o que se deve e não deve comer, os hábitos e atitudes saudáveis - mesmo eu tendo sido uma criança que deu muito trabalho neste sentido. Por outro lado, foi a única pessoa que me ajudou a ser vegetariano e que nunca pegou no meu pé por isso. Mais tarde, ela também adotou tal regime. Sem extremismos. De todos da família, ela era a que mais se cuidava de dentro para fora. Fazia alongamentos, pulava cordas, caminhava vigorosamente - por vezes, corria - nos parques, todas as manhãs e muitos finais de tarde. Até a doença começar a dar seus sintomas, fazia ginástica há alguns meses no Ginásio Poliesportivo Pedro D'Anotnia. Aliás, um 'mal estar' durante os exercícios, foi um dos primeiros sinais, que, mais tarde nos fez descobrir o tumor.

Nunca aprendera a dirigir, mas nada a impediu de se deslocar a distância que for. Na chuva ou no sol, para cumprir seus afazeres, ou me levar no dentista, médico, que fosse, não havia tempo ruim para a minha mãe. Só tempestade, da qual sofria um tipo de fobia. Mas viagens de 2 horas de transporte público lotado, em pé, debaixo da chuva, era algo que raramente a vi reclamar. Especialmente, quando me levava até a UMESP em São Bernardo para tratar dos meus dentes. Ela sempre me transmitia a ideia de que estava cumprindo um dever, com o amor, e sem se inportar com o tamanho do desafio. Quantas vezes não percorreu um caminho de quase 1h30 só para me buscar na escola?

Muito antes de eu estudar Matemática e Economia, minha mãe me ensinara, na prática, o que é cuidar das finanças do lar. Ela sim foi um exemplo de pessoa economica. Que mesmo na simplicidade da vida, das atividades pouco rentáveis, sempre conseguira juntar uma pequena quantia de dinheiro para suprir alguma necessidade em casa, alguma roupa para os filhos, alguma reforma. Raramente, gastava consigo. Não me recordo de uma única vez que ela esbanjou em algo. Uma pessoa pouco apegada a luxos e vaidades. Ia no Brás de trem. Com ela, aprendi a fazer compras na Zona Cerealista. O que fosse possível, fazia com as próprias mãos. Procurava pelos melhores preços aqui e ali (às vezes, até exagerando de tanta indecisão).

Com a minha mãe, aprendi o valor que cada centavo, cada real possuí. Aprendi a ser grato, mesmo quando o prato principal é um miojo. Todavia, quantas vezes nao preparava verdadeiros banquetes? Aprendi a economizar. Aprendi modéstia. A ter uma vida simples, grato e contente pelo pouco que se tem; aprendendo a extrair o máximo possível daquilo que possuo, mesmo que seja algo bem antigo. E uma coisa que ela não suportava era quando alguem da família gastava dinheiro à toa com algo supérfulo.

Considerava o trabalho tão essencial e importante na vida que, diversas vezes, enquanto eu ainda estava completando o ensino médio, ela pegava no meu pé (e como pegava), para eu conseguir um trabalho, para ajudar pagar as contas da casa, dívidas da família e ter meu dinheirinho. Quantas vezes não falou para mim a importância de eu conquistar "o meu dinheiro", poder comprar as minhas coisas, ter minha independência, crescer, prosperar. Que o sonho dela - muitas vezes - era de poder me ajudar a comprar, conquistar algo de grande valor. Para isso, repetidas vezes, me contava da história dos pais dela e de como ela e meu pai juntaram dinheiro para conseguir comprar o terreno e erigir a casa. Me surpreendendo novamente, foi praticamente quem me deu o presente de casamento mais caro de todos. Para ela, significou tanto este ato, que o valor parece ter ganhando uns 6 dígitos a mais. Lembro de certa vez quando ela disse que gostaria tanto de poder me dar um carro, pois ela via algo que eu ignorava... enquanto eu estava tranquilo na minha auto-suficiente bicicleta, ela percebia quantas oportunidades um carro traria, e, se incomodava que eu não estivesse aproveitando a juventude, viajando, conhecendo os lugares, paquerando, namorando. Quantas vezes ela não me disse que a juventude passava muito depressa, e que eu deveria aproveitar.

Ela me ensinou muito sobre religião e cristianismo, mesmo sem conversamos muito sobre. Como? Com ações, com a tendencia dos seus pequenos atos, hábitos e palavras no dia-dia. Quantas vezes, em uma sexta-feira a noite, não a via, em casa, ouvindo, repetidas vezes, músicas cristãs e infantis, preparando verdadeiras obras de arte de tudo qualquer tipo - super criativos - para, no dia seguinte, entreter e ensinar valores biblicos para crianças? E olha, incontáveis vezes, ficava madrugada a dentro, só para terminar. Fazia tudo isso com coração. Para Deus, para as crianças. Não pedia nada em troca. Mesmo que, diversas vezes, ficara decepcionada, pois, nenhuma criança aparecia, mesmo após tanto esforço. Suas criticas e observações sempre foram bem ponderadas; ajudaram-me a ver coisas com outros olhos, e, eu, que muitas vezes me achava sendo 'o entendido', ficava surpreso com os olhos da experiência que ela possuia.

Inquieta, quando você menos via, ela estava preparando algo para ajudar alguém e, muitas vezes, ir com minha tia e pessoas da igreja, visitar pessoas necessitadas, ou mesmo levar uma cesta básica na favela.

Uma pessoa estudiosa, sempre pegou no meu pé quanto aos estudos (mesmo eu sendo um aluno com frequentes notas vermelhas). Ela sabia que a única forma de termos alguma chance de ter sucesso na vida, conquistar melhor qualidade de vida, seria através de estudos e esforços pessoais, pois, o berço não foi de ouro - longe disso. Não havia tempo ruim para estudos. Não importava a chuva, meu sono, fome, febre, doença, a menos que estivesse muito ruim, tinha que ir para a escola e ponto; assim como estudar para provas - ela até chegou a fazer várias 'provas' para eu estudar (isto, muito antes de eu imaginar o que era um simulado de vestibular). Só parou, quando viu que eu andava com as minhas próprias pernas nos estudos, e que os resultados eram satisfatórios. Mas ainda assim, broncas e puxões de orelha sempre estavam presentes. Ora por estar há muito tempo na rua jogando futebol com a garotada, ora por estar há muito tempo no computador/videogame me entretendo com algum jogo. Aliás, passei pela experiência dela me encontrar jogando fliperama no Bar, próximo à padaria, com o troco do pão, e receber umas boas chineladas, para nunca mais repetir a dose. Porém, mesmo quando entrei na USP, ela não socegou de me pressionar de conseguir um trabalho até que, finalmente, eu consegui [uffa! ela estava certa]. Vale considerar que ela estudou a noite para terminar o Ensino Médio, após um dia muito cansativo de trabalho e isto significava que dormia muitas vezes na sala de aula, de modo equivalente ela queria que eu tambem não tivesse molesa, neste sentido, que soubesse lutar e trabalhar duro, estudando a noite se preciso.

Me contou bastante da época da escola dela, no período militar. Sempre falou muito bem da escola e como era aqueles tempos. Exceto para uma única professora que ela teve, que se lembrou alhumas vezes de como ela foi malvada e cruel com ela.

Sempre se preocupou em nos dar o melhor em termos de Educação, possível. E assim conseguira uma bolsa de estudo para eu como meu irmão estudarmos no Colégio Adventista de Santo André. Do meu bairro e rua, fui um dos únicos que pôde estudar numa escola privada (meus amigos achavam que fossemos rico por isso). Para o material didático, procurava SEBO, ex-alunos, etc. Vivi com livros usados. E lembro que no terceiro ano do primário, derrubei suco de uva na mochila, e usei o material, livros, tingidos de roxo, pelo ano inteiro.

Nos seus conselhos amorosos de mãe, "Você precisa ter uma renda, um carro, para poder paquerar, levar a namorada para sair, comprar um presente", "Nenhuma mulher se interessa por um homem sem dinheiro e vagabundo" - eram conselhos que ela dava, mesmo, muitas vezes preocupada por eu ser tão 'caseiro' e, raras vezes, me preocupar de conseguir uma namorada. Dizia isto quando eu ainda nem sabia o que era ter um salário. Alertas não faltaram quando comecei a namorar. Certa vez, avisou: "Olha, filho, sai dessa. Que ela só esta te enrolando." E, pouco tempo depois, descubro da pior maneira possível que ela tinha toda razão. Aliás, o sexto sentido da minha mãe era, por vezes, assombroso. Alguns até brincavam de "praga da tia Rute". Se falasse que ia chover, podia esperar um temporal. Se ela falassr para você levar uma blusa, você se arrependeria amargamente se não ouvisse ela.

Inúmeras vezes, ela assistira filmes e programas de TV comigo [até mesmo meus peculiares gostos de engenharia, séries médicas...]. Levei-a em consertos de música, e em algumas programações em que eu tocava. Recordo de quando levei ela para ouvir a 4a Sinfonia de Bruckner, e ela não pareceu ficar nem um pouco impressionada com aquilo [sinceramente, acho que ela não gostou]. Demorou para cair a ficha, depois de muito tempo, entendi que ela apenas queria 'estar presente', curtir a companhia. E ai está outro valor que ela me ensinou: o apego a família. A família estar bem unida, mais do que isso, reunida, passar tempo juntos era um dos valores mais elevados da minha mãe. E, neste sentido, por vezes ela batalhou para me ensinar isso, sobretudo quando meu comportamento mais introvertido me fazia querer ficar 'mais na minha' no computador, livros, filmes, ao invés de interagir com os familiares; ela me dava uns toques/ordens para ir ficar com a família.

Me ensinou a cuidar. Como? Novamente pelo exemplo. Minha mãe cuidou de muitas pessoas, e pude acompanhar de bem pertinho muitos casos. Aliás, para começar, a maneira como cuidou de mim, sobretudo nos momentos em que estive bem adoentado e internado. Cuidou de primos desde bebês, até adolescentes, de minha tia quando teve problemas cardíacos, assim como de minha falecida avó. Destaco a maneira como ela cuidou da mãe dela, qual, nos últimos anos de vida teve Alzheimer, cada vez mais avançado, incluindo uma diabetes. Mesmo nos momentos mais difíceis, em que muitos perderiam a paciência, minha mãe mantinha o carinho e cuidado a todo vapor. Não foi só com ela, mas muitos outros, inclusive conigo. Mesmo quando eu agia de maneira grosseira com ela ou não agia de maneira agradável, ela continuava a lavar minhas roupas, preparar uma deliciosa comidinha caseira, sem reclamar. As vezes, a vi chorar, mas, geralmente, se escondia no quarto para que não vissemos; quarto este, onde costumava orar de joelhos por cada um da família. Com minha mãe aprendi que amar também é cuidar, wuerer e lutar pelo bem do próximo, mesmo quando tal não corresponde, não reconhece, falha com você.

Por outro lado, o desejo de cuidar levou a medos exagerados quando se tratava de suas fobias. Como o temor dela pelas minhas trilhas e acampamentos no meio da mata. Para ela, era certeza que a qualquer hora uma cobra iria me picar, um raio cairia sobre minha cabeça numa partida de futebol na chuva, ou uma tuberculose me atacaria ao abrir a geladeira e andar descalço após o banho quente. O medo que eu iria morrer por qualquer risco, era exagerado; mas mostrava sua preocupação e o quanto se importava com minha saúde e vida. Sim, em tudo isso, eu reconhecia o quão que ela se importava. O quão queria nos proteger. Queria nosso bem. Quantas vezes não me quiz poupar e mesmo ajudar, ficando acordada até tarde, só para deixar o portão da garagem aberto para eu chegar da USP, por volta das 00h00 - 01h00, ou preparando um delicioso chá com alguns biscoitos? Quantas noites não passava noites em claro tentando falar com meu irmão que tinha ido para balada?

Mimado? Ela tentou me mimar ainda mais. Aliás, caçula. Mas eu que não deixei ser tão mimado; fazia questão de contrariar ela, muitas vezes, apenas para poupá-la e mostrar que eu tinha que me virar. Mais acentuado ficou quando anunciei que iria casar. Aliás, eram os últimos dias morando com ela. Por outro lado, ela sempre respeito minha liberdade de escolha, nunca impediu, nem mesmo quando escolhi fazer karate e outras coisas contrárias a vontade dela. Ela aceitava minha escolha. Neste sentido, ela sempre zelou para que desenvolvessemos nossa capacidade de escolher, planejar, assumor riscos, mesmo de coisas que ela sabia wue era errado ou que resultaria em arrependimentos (mas claro, era comum antes ela alertar e, depois, "praga de mãe").

Seu dia da semana mais especial era o sábado. Não só pela bênção de Deus. Mas era geralmente o dia que eu almoçaria em casa. E ela não poupava esforços em querer fazer do almoço deste dia, um verdadeiro banquete. Em especial, quando a casa ficava cheia, com familiares e amigos. 'Servir' era a essência dela. Por vezes, era mais comum ela querer ficar na cozinha e servindo, tentando deixar tudo o mais agradável possível para os visitantes e familiares do que, de fato, passar aquele tempo conversando e interagindo com eles. O trabalho de servir dela, por vezes, falava muito mais do que prozas e poesias. O que, por vezes, me cortava o coração quando escolhia passar este dia com amigos, ou em uma programação longe, ou almoçar na casa de alguém de última hora, e, ela, muitas vezes, ficando a tarde toda sozinha em casa. Mas sábado e domingo eram os dias que passávamos mais tempo juntos.

Nunca andou de avião. Não era seu sonho e vontade ficar viajando pelo mundo a fora. Se tivesse muito dinheiro, talvez se desse um pouco este luxo. Por outro lado, sempre desejara passar tempo com a família. As vezes, aceitando viajar com a família mesmo quando, as condições de saúde e financeiras pediam para ficar em casa.

Uma mulher forte e guerreira. Firme nos seus propósitos e crenças. Quase nunca ficava doente, e quanso ficava, logo passava. Resistente a dor e a fraqueza. Me ensinou, na prática, o que é resiliência. Podia estar com febre, mas lá estava ela cuidando da casa, mesmo quando falávamos "Mãe, descansa."

Rute, que mulher forte! Com mais de 50 anos, caminhava quase 8 km para ir na casa de minha tia para cuidar da filha dela, passava a tarde inteira e, às vezes, voltava os 8 km caminhando também, e não deixava as coisas de casa por fazer. Não tenho sombras de dúvidas que foi esta força e fibra física-mental que permitiu que resistisse a este cancêr agressivo por tanto tempo, tão lúcida, com qualidade de vida e nível 'incomodo' que impressionava os médicos. Por outro lado, quando a via de fato 'entregue', deitada, cansada, sem coragem para levantar da cama, ou reclamando de alguma dor, era de partir o coração, pois sabia que significava que, para ela, estava muito forte, insuportável; sabia que, de fato, minha mãe estava mal e que eu precisava ajudá-la de alguma forma.

O cancer chegou de surpresa, para todos. Por que ela? Nada fazia sentido. Era talvez a pessoa mais saudável de toda a família. A que mais se cuidava. E uma das mais zelosas a bons hábitos que já conheci. O diagnóstico e tratamento chocou a todos. Mas, minha mãe, novamente foi guerreira. Foi zelosa ainda mais em seus hábitos, o que certamente aumentou muito sua sobrevida e qualidade de vida conforme a doença consumia seu corpo.

Lúcida, sempre procurou manter-se com a mente ocupada e ativa. Pelo menos lendo a Biblia, alguma literatura, um caça palavras, quando disposta mentalmente, pois a doença, por vezes, produzia uma condição de extrema fraqueza e moleza. Mas para quem convivia com uma anemia de assustar, ela era incrivelmente disposta, forte e ativa. Mesmo poucas 2 meses antes de falecer, extremamente magra e fraca, quando teve um pouco de forças e disposição, ajudou minha tia na confecção de dezenas de máscaras para combater o Covid-19. Nestes 1,5 anos de câncer, pude estar com ela praticamente todos os sábados e, outros dias, mas, no fim, pareceu ser pouco. E, apesar do desconforto da doença, ela nunca demonstrou recair nesses princípios; pelo contrário, cada dia era uma nova lição para mim. Aos poucos fui descobrindo quantas coisas ela evitou de me contar, apenas para me poupar. E quão forte ela foi. Não entrou em depressão em nenhum momento, apesar da tristeza.

Finalmente chegamos no maior valor que minha mãe me ensinou. Ela me ensinou o significado prático do que é o amor e querer fazer, de coração, o bem ao próximo. Em especial, o amor da família Costa. O legado de seus pais, meus avós. Uma família única, mesmo com seus defeitos. Amar mesmo aqueles que, por vezes, não nos respeitam. Amar na saúde e na doença. Amar mais do que o sono. Amar mais do que os próprios sonhos. Amar mais do que a si mesmo.

E, certeza eu tenho, de que quanto mais eu pensar nesses 34 anos no que pude conviver com esta maravilhosa mulher, mais lições irei descobrir desta humilde e baixinha mulher, qual teve o mais puro dom da arte de ser 'minha mãe'

Seu hino favorito: 70 - Porque Ele vive ( https://youtu.be/wLgFvgkQWmw )

Seu trecho favorito da Bíblia: Salmo 121

1 Elevo os olhos para os montes: de onde me virá o socorro? 2 O meu socorro vem do Senhor, que fez o céu e a terra.

3 Não deixará vacilar o teu pé; aquele que te guarda não tosquenejará. 4 Eis que não tosquenejará nem dormirá o guarda de Israel.

5 O Senhor é quem te guarda; o Senhor é a tua sombra à tua direita. 6 O sol não te molestará de dia, nem a lua, de noite. 7 O Senhor te guardará de todo mal; ele guardará a tua alma. 8 O Senhor guardará a tua entrada e a tua saída, desde agora e para sempre.


19 dezembro 2019

Esofagite - Tudo detalhado sobre meu tratamento

0 comentários
O intuito deste post é ajudar o leitor com detalhes sob o ponto de vista de quem conviveu e tratou desta doença. Espero que este possa ajudá-lo caso esteja passando pelo mesmo problema, ou conheça quem esteja passando. Caso queira perguntar algo, sugerir algo, comentar algo, faça um comentário. Sei que o caso de muitas pessoas é mais complexo e agudo que o meu. Não estou aqui dando uma Lei universal, apenas o relato do que ocorreu no universo do meu organismo.

Conteúdo:
  1. Diagnóstico
  2. Sintomas
  3. Tratamento
  4.  Dicas

O Diagnóstico


No início de 2019 fiz um exame preventivo de endoscopia. Para ser sincero, eu não sentia absolutamente nada até então. Eu possuía uma boa alimentação mais natureba, não bebo bebidas alcoólicas, não fumo, não tomo café e energéticos, evito muito doces, industrializados, refinados, açúcar, sou magro, pratico atividades físicas 2-3 vezes por semana. E, para a minha surpresa, o resultado de que eu estava com esofagite, um pólipo no esôfago e uma gastrite leve. Foi algo surpreendente para mim, pois eu não percebia, sentia nada. Gastrite era algo que eu nunca tive e imaginava nunca há de ter.

Laudo (Resumo):

  1. Esofagite erosiva (Grau A de Los Angeles);
  2. Gastrite crônica leve sem atividade.
Segue imagens e laudos dos meus exames.






Sintomas

Primeiros Sintomas

Pouco menos de 1 mês após o exame, comecei a sentir os sintomas. Uma sensação mais quente na parte superior do estômago, um pouco abaixo do externo mais internamente, porém, é possível sentir a pele na região mais quente. Junto com isso veio uma sensação como se houvesse ‘uma bola internamente ‘apertando', um tipo de estufamento, parece com a sensação de engasgo, junto com uma sensação de gás. A reação automática do organismo é querer arrotar, mas não havia gazes propriamente dito para arrotar. É como uma sensação constante de querer arrotar que não passa. Junto com um ‘aperto’.
Esta sensação surgiu numa manhã de sábado. No decorrer do dia, foram se intensificando até que comecei a sentir, pela primeira vez, a sensação de refluxo, mesmo eu estando em pé. Aquele sensação do conteúdo estomacal subindo um pouco pelo esôfago, acompanhando se um hálito diferenciado e um sabor mais azedinho na saliva.

Sintomas tardios

Estes primeiros sintomas passaram a ser comuns, rotineiros. Incluindo novos sintomas, como a sensação de refluxo ao deitar-se, ou ao acordar a sensação de que houve refluxo durante a noite. Fazendo parte disso uma sensação de ardência na garganta parecido com uma inflamação de garganta, mas é notavelmente diferente (Não é agudo, é mais persistente, alivia ao beber água, não dói para engolir, sem febre, sem gânglios inflamados, passa em algumas horas.). Junto com isso, começou a surgir maior secreção na garganta (catarro), mas você logo percebe que não vêm do pulmão ou das vias respiratórias.
Após 2 meses, o estômago e esôfago passaram a ser muito sensíveis. E é difícil encontrar um padrão. Algumas coisas foram evidentes logo de cara, como comer melado de cana – a ardência surgia rapidamente e deforma aguda. Depois, o mel também começou a incomodar em menor nível.
Também notei desgaste nos dentes, mais sensibilidade. Textura mais áspera do esmalte. Era um desgaste provocado pelo aumento da acidez da boca. Durante o tratamento já tive que tratar de 2 cáries e 1 que chegou a virar caso de canal além de alguns episódios de sangramento da gengiva.
Em alguns casos raros tive gases estomacais. Mais comum surgir 1-3h após uma refeição. Porém, houve situações que surgiu mesmo de estômago vazio. E esses gases chegavam a fazer barulho e até arrotos dignos de uma bebida gaseificada.
Nos primeiros 3 meses, parecia que não havia mais uma porta fechada entre meu esôfago e o estômago. Eu não podia mais correr, pular, fazer abdominal, deitar na horizontal. Era refluxo certo! Parei com essas atividades e troquei a corrida principalmente por caminhadas. Mas vale lembrar que o refluxo vinha, às vezes, mesmo estando em pé e parado.
Não sei dizer se há relação, pois tenho histórico de hemorroidas. Mas passou a ser comum sangramento nas fezes e cheguei a ter uma inflamação com trombose para qual tive que fazer um tratamento de 1 mês para sumir.

A(s) Causa(s)

Para mim, a GRANDE causa é ainda desconhecida. Mas há candidatos. Na verdade, uma união de candidatos combinados. Um deles era o stress do dia-dia. Pois além do trabalho bem corrido, a noite estava fazendo mestrado e ficava até muito tarde da madrugada estudando, dormindo em torno de 5h por noite. E, uma vez casado, aumentam também as responsabilidades e deveres em casa, reduzindo o tempo para ‘desestressar’. Até mesmo os sábados passei a ter comuns situações de stress nos cultos da igreja que costumo congregar, sobretudo devido a música e som alto, além de, geralmente, não poder tirar o sono atrasado nos fins de semana.
Em termos alimentares. Desde que me casei (2 anos na época), passei a comer mel e melado praticamente todos os dias (o que era menos frequente antigamente), assim como a consumir azeite nas refeições. Também, nos últimos meses, estava sendo comum comer uma sobremesa após o almoço (geralmente, com açúcar). E, no geral, acho que aumentou o consumo de carboidratos e itens feitos com aveia e trigo, nos últimos anos. Também estava sendo muito comum deixar de almoçar para comer açaí misturado com outros itens, e outros junk foods, devido a utilizar o tempo do almoço para trabalhar na dissertação. Talvez, estas foram os principais pontos que contribuíram negativamente neste quesito.
Durante o mestrado, diminui drasticamente a frequência de atividades físicas. Não passei a comer mais, porém engordei quase 6 kg em 2 anos. Chegando ao meu recorde, de 79kg. Sendo que, quando solteiro, nunca passei dos 74kg (tenho 1.82m). E o que mais notei foi o aumento da gordura na região da barriga. Considero este, um dos principais fatores.
Era comum, desde o tempo da graduação comer e dormir antes de terminar a digestão. Mas simplesmente eu não tinha nenhum problema de mal-estar estomacal e refluxo. Então eu praticamente não ligava muito se não pudesse esperar a digestão terminar para ir dormir.
Coincidentemente, a descoberta da esofagite e gastrite surgiu 1-2meses após minha mãe ser diagnosticada com câncer de estômago. Houve um choque emocional. E, coincidentemente, na mesma época, meu irmão também foi diagnosticado com o mesmo problema num nível mais agudo, pois, no caso dele, sua inflamação do estômago estava também relacionado com a bactéria H. Pilory (que não foi meu caso). Porem, meu irmão já teve histórico de úlcera no estômago. Eu, no máximo, um período de náuseas. Mas talvez o choque emocional deste período também contribuiu.
Fator idade. Querendo ou não, estou envelhecendo. Já passei dos 30. Com 33. Como diz o ditado: “Depois dos 30, sempre vai ter uma dorzinha.”

Tratamento

Quando vi o resultando dos exames, me chamou muito a atenção as imagens da endoscopia, a inflamação, o pólipo. Estranhei, pois eu não sentia absolutamente nada! [Apesar depois fui perceber que eu já convivia com alguns sintomas raros e esporádicos, como sentir um pouco de refluxo quando corria, ou fazia abdominal. Um pouco de incomodo para digerir alguns alimentos.] Mas enrolei um pouco (procurando um confiável) para marcar um médico gastroenterologista.
Quando os primeiros sintomas vieram à tona (o exame parece que lhes despertou de vez), comecei a tomar chá de camomila e água de coco, assim como alguns cuidados maiores com horário de comer. Porém, nenhum teve efeito significativo. Acho que a água de coco até chegou a aumentar o incômodo.  Foi quando senti a sensação de refluxo durando horas, pela primeira vez, senti a necessidade de procurar um especialista quão logo, pois era evidente a evolução dos sintomas. Me inteirando mais do assunto, procurei por diversos vídeos e conteúdos na internet sobre o assunto – eu estava quase convencido por mim mesmo que era algum problema puramente mecânico e que a única correção seria cirurgia.

Dias 1 - 45

Foi quando comecei o tratamento com o Dr. Jurimar Alonso. As orientações da primeira consulta foram:
  • 1 comprimido de Esomeprazol todas as manhãs, 1 hora antes da refeição. Por 45 dias.
  • 2 comprimidos de Domperidona por dia. 15min antes do almoço e da janta. Por 45 dias.
Mudanças e instruções alimentares:
  • Cortar doces, açúcares e alimentos com sal. Inclusive refrigerantes (que eu já não bebo há anos).
  • Cortar ingerir líquidos nas refeições.
  • Cortar alimentos gordurosos. Inclusive as castanhas (que eu comia muito todos os dias), azeite, azeitonas, frituras, industrializados, processados...
  • Diminuir a ingestão de alimentos muito proteicos, especialmente os de difícil digestão. Pães, dar preferência por fatias torradas.
  • Cortar as massas.
  • Se for comer carnes, que fossem leves e pequena porção.
  • Comer de 3 em 3 horas, evitar de deixar o estômago vazio.
  • Diminuir a quantidade ingerida numa refeição só.  A ideia é comer porções pequenas ao longo do dia.
  • Cortar alimentos e frutas ácidas (inclusive sucos e legumes como o tomate). [Foi quando me deparei que a maior parte do nosso repertório de frutas no Brasil são ácidas.]
  • Não tomar bebidas quentes. Se for tomar chá, esperar esfriar.
  • Esperar pelo menos 2h para beber água após a refeição.
  • Dormir pelo menos 2h após a ultima refeição (esperar terminar a digestão).
  • Comer bastante verduras, legumes e frutas. Preferência por alimentos fibrosos. 
  • Cortar os condimentos e temperos.
  • Comer sem pressa, em um ambiente calmo, tranquilo. Mastigar muito bem e com calma.
Outro ponto muito importe foi a recomendação de elevar a posição de dormir. Ele recomendou em elevar a cabeceira da cama em 15-30cm. Deu algumas dicas de colocar livros, páginas amarelas no pé da cama ou debaixo do colchão.
Esta foi a primeira consulta, entre abril e maio de 2019.

De início, eu não senti absolutamente nenhuma melhora, com o tratamento. Isto apenas fortalecia a suposição de que meu problema era algo mecânico. Eu pensava muito na hipótese de hérnia de hiato apesar do exame dar negativo. Mas o fato de não fazer alguns exames mais específicos dava margem para a dúvida.
Foi apenas por volta do 30 dia que senti uma melhora nos sintomas. Começaram a ocorrer situações ou dias em que não sentia nenhum sintoma. Porem, muitas vezes, o menor descuido, ou exagero, ou, quando menos esperava, algum sintoma aparecia.
O sintoma mais preocupante de todos era refluxo. Entre os dias 38-42 eu me sentia praticamente curado, nenhum sintoma. Até que, de repente, em um sábado a noite, ocorre um episódio de gases no estômago que não sabia a origem – talvez algo que comi. Então, eis um refluxo. E, no dia, seguinte TODOS os sintomas voltaram na mesma intensidade que no início do tratamento. Ficou claro que, por mais que melhorasse, bastava um episódio de refluxo para destruir dias, semanas, de tratamento. A preocupação número 1 quando acordava passou a ser em reparar se havia algum sinal de que tive refluxo durante o sono.
Neste período também comecei a anotar absolutamente TUDO o que eu comia, a quantidade, e as sensações que me provocavam quanto ao estomago e ao esôfago. Como eram os sintomas antes e depois da refeição. Mas, após alguns dias, parei de anotar. Pois tomava MUITO TEMPO. Um tempo que eu não tinha.

Dias 45 - 90

Voltei ao médico decepcionado de que não estava curado, mesmo tomando remédios por tanto tempo! O médico disse que foi muito bom meu avanço, para eu continuar com o tratamento. Apenas diminuiu a dosagem pela metade (gramas) dos medicamentos e falou para parar de tomá-los assim q acabasse a ‘a cartela' até voltar na consulta.
Fiz exatamente isso. A esta altura eu também estava começando a ter dores nas costas (cheguei a fazer fisioterapia). E um dos motivos era a minha posição de dormir. Pois o que importava, não era tanto aumentar o travesseiro (eu estava dormindo com um salsichão grande dobrado mais 1 travesseiro). O que precisava era de algo que aumentasse a inclinação do troco desde a cintura. Foi quando uma amiga do trabalho que tinha gastrite disse que comprou um travesseiro especial, uma prancha. Procurei por um travesseiro ortopédico para refluxo, e comprei um que chega a 15cm de altura e sobe como uma rampa desde a linha da cintura. Porém, a decepção é que, ao deitar-se, o peso faz com que o ganho mesmo seja de uns 8cm no máximo. De modo que, desde então, tenho usado a rampa mais 1 ou 2 travesseiros. Ainda assim, por vezes, acordo fora da tampa, dormindo na horizontal. A boa notícia, a dor nas costas sumiu e não voltou mais. Porem, nos primeiros 2 meses comecei a ter dor nos cotovelos, pois devido à altura, os braços acabavam ficando mais suspensos e se apoiando na cama pelos cotovelos. Mas de alguma maneira isto parou de acontecer.
Os sintomas foram se tornando mais brandos. Passou a ser mais comum ficar dias sem sintomas. Porém a esta altura, eu conhecia já melhor as sensações do meu trato digestivo e esôfago. E percebi que se colocasse a mão sobre a base do externo e sentisse uma temperatura mais elevada, ou se pressionasse levemente com a mão a região da base do esôfago e superior do estômago e sentisse alguma sensação de dor leve, ou dolorido, ou incomodo, ou simplesmente diferente de pressionar outras partes saudáveis e indolores do corpo, era sinal de que ainda o ferimento, a esofagite, ainda estava lá.
Com o tempo tomei mais ciência de detalhes e alguns padrões no meu corpo. Notei que a água vinda da rua, mesmo que filtrada, incomodava um tiquinho ao ser ingerida. É uma sensação que você apenas toma conta quando compara minuciosamente com a sensação de tomar uma água como a Minalba. Logo comecei a comprar água da Minalba. E pessoas no trabalho que sofriam de gastrite e problemas intestinais já costumavam reclamar da água do filtro do escritório e compravam água de garrafa para elas. Fiz isto por 2 semanas, mas não era prático levar água para o trabalho todos os dias (para quem bebe muita água).
Notei que não adiantava dormir inclinado com os travesseiros na cama se estivesse com o estômago minimamente cheio, mesmo que apenas de ½ copo d'água. Era refluxo na certa. E isto aconteceu TODAS as vezes que estava cansado demais e não esperei a digestão total para ir dormir. 2 horas é um mito! Às vezes, leva 3-4 horas. Mesmo que alimentos leves e em baixa quantia. Para não acontecer o refluxo eu tinha que ficar inclinado, desde a cintura, em pelo menos 60 graus, praticamente sentado. Ou seja, logo descobri que era melhor ficar sentado com as pernas esticadas no sofá que deitado e inclinado não o suficiente na cama. E também descobri que mesmo dormir sentado há risco de refluxo. Pois quando dorme a musculatura relaxa, a digestão fica ainda mais lenta, você acaba tendendo a se inclinar mais.
Também comecei a perder tempo. De 79, reduziu para algo em torno de 77,5 - 78,2 Kg.
A principal dica que descobri foi: evite o refluxo a todo o custo! É melhor dormir pouco do que ter um episódio de refluxo a noite. E, se o estômago vazio, começar a ter sensação de vazio e acidez que incomode e te faz pensar em comer, então coma. Pois é muito fácil, em poucas horas, piorar aquilo que demorou semanas para melhorar.

Dias 90 – 135


45 dias se passaram. Os sintomas aliviaram muito. Na maior parte do tempo não existiam. O exame físico do médico constatou que ainda estava lá. Apesar que bem mais suave e que ainda ocorria episódios. Quando constatei sobre a eficácia do tratamento, ele falou que tratamento de esofagite costuma “durar de 6 meses para mais”, que, em alguns casos pode chegar a ser cirúrgico. Isso me trouxe uma nova perspectiva sobre o caso. Disse para manter os cuidados, especialmente quanto a dormir após a digestão para evitar os refluxos a noite. Cortou a Domperidona e disse para tomar Esomeprasol por mais 1 mês, para ver se cicatriza de vez. Ficar 2 semanas sem medicação, mantendo as orientações, até o retorno.

Suco de Batata Doce

Meu irmão me enviou um vídeo de um rapaz falando mal do Omeprasol e falando do suco de batata doce com a solução dos problemas. E eu resolvi testar. Eu já havia testado outras dicas caseiras:
Suco de couve: trazia algum alívio momentâneo, seu efeito era menor que o da Domperidona. E, às vezes, sentia aumentar o incomodo.
  • Chá de camomila (frio): quando está com uma leve sensação de ardência no estômago, até que alivia um pouco, por um tempo (1-2horas). Mas, não melhora o refluxo.
  • Suco de batata inglesa: ele realmente ajuda e alivia rapidamente, muito bom. Porém, seu efeito some rapidamente (20 minutos e já começa a voltar). Também, depois de uns 3 dias tomando, parecia diminuir seu efeito.
  • Suco de limão diluído na água: para a minha surpresa, não senti nada da primeira vez que tomei. Nem melhora nem piora. Acho que teve um efeito de ajudar a acelerar a digestão, mas não usei mais, por receio por ser muito ácido.
  • Chá de orégano (frio): tomei poucas vezes. Não senti nenhum efeito de imediato, porém, depois de uns minutos, ele tem um efeito bem longo por umas horas de melhorar a ardência. Mas, também não faz milagres, depois volta, e não necessariamente em nível melhor. Mas foi um dos melhores chás com efeito positivo.
  • Repolho: não melhorava. Mas se tornou um excelente alimento, muito consumido, pois saciava e notava não irritar, sempre caia bem. Especial o repolho roxo.
  • Mel: em grande quantidade irritava um pouco.
  • Própolis: não tentei, tomei uma vez só diluído em um chá, mas não senti nada significativo.
Testei o suco de batata doce. Apenas bati no liquidificador com 2 copos de água e coei. O resultado foi surpreendente. Trouxe um alívio imediato maior que o da batata inglesa e com um efeito mais prolongado. A partir de então, passei a tomar suco de batata doce batido com couve (ficou até mais gostoso) todas as manhãs junto com o esomeprazol. O resultado foi muito positivo. Inclusive algumas noites, especialmente quando estava sintomático. Porém, não faz aquele milagre da propaganda do vídeo, houve dias que parece não ter feito muito efeito, ou aliviava parcialmente.

Tofu e pão torrado


Também reparei que o Tofu digeria muito bem e sem causar incomodo. Passei a consumir muito tofu. Surgiu a expressão “Estou tofusado.”, de tanto Tofu que comia. O pão integral caseiro torrado também se demonstrou muito bom! Deixar levemente torrado na sanduicheira é melhor do que sem torrar. Já o pão industrializado comprado de mercado, você percebe que a digestão não é mesma, é mais difícil, tende a incomodar.
Os sintomas foram melhorando bastante. Começou a ficar comum ficar dias sem sinal de refluxo e outros sintomas. E, inclusive, eu pude diminuir a frequência das refeições, voltando a comer 3 vezes por dia, às vezes, comendo algo no meio da tarde, caso percebesse o estômago pedindo. [O ponto chave é você antecipar quando percebe SINAIS de que o estômago/esôfago pode começar a ficar mais ácido.] Porém, o outro lado, é que, às vezes, se insistir por um tempo sem comer, a ardência passa e tudo fica ótimo. Outras vezes, você vai se arrepender.
O mais surpreendente era quando, ao acordar, notava que estava na posição horizontal e sem sinal de ter tido refluxo. Porém, houve dias em que, principalmente a noite, eu tomava uma Domperidona pois sentia que algo que não comi não caiu bem, a digestão ficou muito lenta, ou deu uma crise sintomática maior, ou com a sensação de que, aquela noite o refluxo viria fácil – às vezes, sem a menor dúvida. Ou em algumas situações, quando tomava o Venalot (por causa das hemorroidas) e ele é um remédio que geralmente irritava o estômago na digestão (dica, se for tomar Venalot, não tome de estômago vazio ou apenas com água).
O Esomeprazol acabou e agora vinha o teste. Por precaução, nos primeiros 3 dias, tomei Domperidona pela manhã. Mas depois deixei, fiquei sem medicação, apenas com o suco de couve e batata doce pela manhã. Nos primeiros 2-3 dias, eu senti alguns sintomas, até mais fortes. Logo pensei no fracasso e que logo teria que voltar a medicação e que isto não curaria tão rápido. Porém, na manhã seguinte, eu não senti nada. Passei o dia bem. E passei 1 semana seguida, sem remédio, sem sentir praticamente nada. Na segunda semana, até abusei um pouco, comi algumas castanhas. Comi um pouco de pasta de amendoim. E pasme, até suco de uva! [Que saudade!] Até cheguei a comer um docinho. E com um saldo de raros episódios para lembrar que a doença permanecia e eu devia pisar no freio.
Perdi mais peso. De 77,5 passou para 74,8 – 76 Kg. A barriga diminuiu bastante. Alias, no meu ver, houve uma grande correlação de melhora dos sintomas conforme a barriga e o peso diminuíram.

Dias 135-180


Fim dos 45 dias e nova consulta. Desta vez, eu estava empolgado. Imaginando que o médico já até pediria uma nova endoscopia. Não sentia absolutamente nada há quase 5 dias. Porém, no exame clínico de apalpar a região da barriga, estômago e esôfago, foi a vez que menos senti incomodo ou algo próximo da dor. Mas senti, ainda um pequeno pontinho lá embaixo do esterno que me fez pensar: “Ainda tem um pouquinho ali, Evandro. Tome cuidado. Estamos quase lá!” O médico então pediu para eu ficar mais 45 dias em observação, sem remédios, para ver se cicatrizou mesmo o ferimento. Pediu para ainda cuidar bastante da alimentação. Não falou que eu poderia a voltar as coisas que foram cortadas, mas disse para eu me cuidar e maneirar bastante no Natal e Ano Novo, não exagerar na comida. E também orientou muito no sentido de eu comer muita verdura, legumes, vegetais, mastigar muito bem, dar preferência por alimentos ricos em fibra, beber muita água.
No mesmo dia, acabei abusando um pouco, tomei inclusive meio copo de suco de uva. E praticamente todo dia comia alguma coisa que eu não podia, ou que não comia há meses. Porém, aconteceu de nas duas noites seguidas eu ter dormido mais cedo e acordei com a sensação de ter tido refluxo a noite. Também passei um dia com o estômago no estado de “estou sensível, não abuse, seja cuidadoso, senão algo vai acontecer”.

Continua....


Dicas adquiridas por experiência própria

 #Alimentos (Principal parte)

  • Banana maçã: pode comer.
  • Banana nanica: em geral pode comer, mas as vezes irrita, garantir que esteja bem madura antes de comer. Banana prata: não comer.
  • Laranja lima: pode comer.
  • Mamão, melancia e melão: pode comer a vontade.
  • Manga: pode comer. Cuidado para não comer uma não madura.
  • Abacate caiu muito bem. Comi muito nos primeiros meses.
  • Frutas não maduras não é uma boa. Não é sempre que vai irritar, incomodar, mas contribui negativamente.
  • Pera: em geral, vai bem.
  • Não comer chocolates, doces, coisas açucaras, gordurosas. A intolerância para o açúcar torna-se gritante.
  • Biscoitos: são raros os biscoitos que são bons. Os biscoitos integrais da marca "Mãe Terra" foram os melhores. Outra coisa industrializada que caiu bem foi a pipoca de canjica assada e alguns tipos de iogurtes, como o de soja da Batavo.
  • Queijo branco fresco do tipo minas e ricota caíram bem. Queijo de búfala, em pouca quantidade cai bem. Queijos mais gordurosos ou muito cremosos, as vezes, basta uma fatia para já “sentir”.
  • Quando comer algo mais gorduroso ou condimentado, comer com outra coisa junta que ajude a 'limpar' a região do esôfago e do alto-estômago.
  • Verduras boas: as melhores opções foram, em ordem: Repolho roxo, repolho, brócolis, alface americano, broto de alfafa, broto de feijão, espinafre, acelga, agrião.
  • Verduras a evitar/não comer: rúcula (principalmente as amargas), salsa, manjericão, folhas amargas em geral, ou com sabor muito forte.
  • Legumes: Batata inglesa, as vezes, não cai tão bem. Beterraba e pepino sempre caíram muito bem. Mandioca, mandioquinha, purê de batata também caem sempre bem.
  • Sempre caiu muito mal: melado de cana, uva passa, açaí com muito guaraná (só o açaí não tem problema), queijos gordurosos, maçã, massas, comida oleosa, feijão grosso/pesado, comida com muito sal, barrinha de cereal. Frutas cristalizadas, como Tâmara e Damasco. Tomate. Maracujá. Cupuaçu. Pastilha efervescente.
  • Em algumas situações, comi Atum e de Salmão, não senti nada de ruim.
  • Água de coco verde, as vezes, não caiu muito bem.
  • Água da Minalba (Ph alto) cai melhor que a água de torneira filtrada.
  • Boas fontes de proteínas sem pesar o estômago: Tofu, semente de girassol, semente de abóbora, soja, leite de soja.
  • Cuidado com o alho. Algo com pouco além da dose, pode provocar uma crise de dor / incomodo por horas.
  • O ovo é de lua. Tem vezes que não dá nada. Tem vezes, que você percebe algum incomodo ou aumento de gases (bafo de ovo). Evite, coma em pequenas quantias.
  • Se for tomar sorvete, não coloque cobertura, chocolate e essas coisas. E pegue um sorvete light, bom, de referencia veganos.
  • Comida fria/morna cai melhor que comida quente.
  • Remédios antiácidos efervescentes em copo, não são uma boa. Demora para dar efeito e, no começo, PIORA/INTENSIFICA os sintomas.
  • Não coma grandes quantias. Coma aquilo que você acha uma quantia média ou pouca. Eu costumava a comer em torno de 450-500gr por quilo, no almoço. Diminuiu para entre 250-330 gramas. Quando pego mais de 400 gramas, em geral, já é esperado alguma sensação depois.
  • Não coloque molhos e temperos. Uma pimentinha pode tornar seus próximos dois dias, um inferno.
  • Se for comer castanhas, coma misturada com outros alimentos, em uma quantidade bem pequena.

# Quanto a alimentar-se

  • Não ficar muito tempo de estômago vazio, especialmente na parte da manhã, quando acorda. Se acordou atrasado, ou não poderá tomar café da manhã. Leve algo para comer antes do almoço.
  • Não dormir antes da digestão ter concluído. E sempre comer numa postura mais vertical.
  • Beber bastante água entre as refeições. Beber sem dó. Nos dias que me hidratei menos, senti mais sintomas.
  • Não senti incômodos com alimentos frios/gelados.
  • Como os alimentos separadamente. Por várias vezes, no almoço eu comia um alimento de cada vez. Exemplo: primeiro coma todo alface, depois, toda a beterraba, e assim por diante. Com isso, você vai descobrindo mais como seu estômago vai se comportar com tal alimento.
  • Não beber com a comida. É impressionante como, às vezes, um golinho de água após a refeição causava até uma dor mais aguda.
  • Coma sem pressa alguma, mastigue até o negócio dissolver. Quanto mais o alimento chegar no seu estômago parecendo uma sopa, melhor.
  • Tente notar quando realmente você sente que o estômago terminou de digerir, já está meio que ‘descansado’ e pronto para beber muita água.
  • Percebi que beber muita água de uma vez não é bom, por exemplo, se você é do tipo que vira o copo, parece com isso. Dê pequenos goles. E tente notar como beber a água ingerindo menos quantidade de “ar”, de modo que a água passe mais facilmente pelo esôfago.
  • Após comer, fique pelo menos em um ângulo entre 60 – 90 graus.
  • O suco de coube com batata doce realmente é uma boa, mas não é a cura milagrosa.
  • Se começou a comer algo, e na hora sentiu intensificar algum sintoma. Pare de comer. E tente comer outra coisa que sabe que alivia. Ou até mesmo beba água (as vezes, água faz milagre).
  • Às vezes, você vai se arriscar em comer algo que vai te fazer mal, e você vai ficar surpreso que até vai trazer um alívio aos sintomas. Vai ficar muito surpreso. E depois, quando for comer de novo, achando que não vai fazer mal, o sintoma surge. Por isso, também não fique se culpando.

# Outros

  • Dormir inclinado o máximo possível. A inclinação precisa começar já desde o nível da cintura.
  • Não dormir de barriga para baixo, nem com nada pressionando seu estômago.
  • Melhor posição para dormir é de barriga para cima.
  • Se for dormir de lado, fiquei virado para o lado esquerdo. Virado para o lado direito,  dá um pouco de refluxo.
  • Invista tempo e dinheiro, se possível, em uma estrutura para dormir inclinado que seja confortável e que não acorde com dores.
  • As horas de sono não impacta de maneira perceptível. Alias, foi comum que as situações em que dormi por mais tempo, foram as que mais tive episódio de refluxo. Provavelmente, por acabar relaxando mais, ficando mais tempo na horizontal, ou pelo estômago por mais tempo vazio. Repito, é melhor dormir menos, garantindo uma boa digestão, do que um refluxo durante o sono.
  • É melhor ficar com sono e dormir menos, do que dormir com a digestão em processo ou ter um refluxo.
  • Tente reparar muito no que vale e funciona para você. A sua sensibilidade no estômago e esôfago são excelentes indicadores.
  • Não tome chá ou bebida quente. Espere pelo menos ficar de morno para frio.
  • Se costuma almoçar em restaurante, procure um que a comida caia bem, leve, não provoque sintomas e que o ambiente seja mais silencioso.
  • Tente descobrir o que está causando stress, situações de stress, incomodo, adrenalina, e fuja, evite elas. Tente não discutir por exemplo.
  • Por mais que o médico e várias pessoas começam a dar muito conselho, você precisa chegar em conclusões por experiência própria do que cai e não cai bem para você.
  • Mantenha seus dentes sempre bem escovados. Ficar sem escovar, aumenta o fluxo de saliva e de fluidos no estômago.
  • Na academia, não faça exercícios que force o abdomem, ou de alta intensidade, ou com muito peso, ou aeróbicos de impacto e pulo. Faça exercícios de ‘velhos cardíacos’, leves, que não elevem sua adrenalina.
  • Tente não ficar neurótico. Pois é comum se pegar pensando no seu estômago, esôfago e nos sintomas a todo momento, principalmente quando for comer.
  • Quando estiver sem sintomas, continue a se cuidar. E qualquer leve sinal de algo estranho, sintoma, ou de sensibilidade. Redobre o cuidado. [E beba água.] Você pode estar há 2 semanas sem nenhum sintoma, e, de repente, um único episódio, desencadeia 1 semana de sintomas agudos como no início do tratamento.
  • Tenha MUITA PACIÊNCIA. Conheci pessoas que convivem com a esofagite e gastrite como algo crônico, é por anos. O cuidado passa a ser um convívio. Pode ser o seu caso.
  • Se alguém te convidar para algo, ou ir comer em um lugar que você suspeita da comida. Avise para ele que está tratando de uma esofagite e gastrite, e que precisa de restrições alimentares.
  • Seja chato com seu dentista, pois geralmente eles não vão dar bola. Alguns dentes meus amarelaram bastante, próximo as raízes e restaurações, além de 2 cáries.
  • Em muitos situações seu estômago se torna uma caixinha de surpresa. Em que, mesmo você fazendo “tudo certo”, de repente, lá vem uma pontada e sensação de ardência, queimação, uma leve sensação de refluxo na base do esôfago.
  • Após um refluxo beba água imediatamente!
  • Os padrões não vão funcionar sempre. Tem dia, que nem esomeprazol, nem 2 comprimidos de Domperidona de uma vez, nem toda água do mundo, nada, vai amenizar os sintomas.

#refluxo #esofagite #estomago #tratamento #gastrite