12 novembro 2011

Música, por Platão

Lendo "A República" de Platão, estou. Livro simplesmente incrivel, extraordináio! Que mente tinha Platão. Alguns, preconceituosos, que normalmente não leram, não conhecem a obra desse filósofo grego, logo tendem a criticar. Mas é incrivel. Tanto a arte do método platônico, de como construir e desconstruir os argumentos, como, sobretudo, suas idéias de como formar uma "Cidade" ideal, vamos assim dizer.

Bem, para desenvolver essa ideia, tudo surgiu da questão "O que é a justiça?" Sim, assim inicia o dialogo socrático. E questionando sobre o que é a Justiça, veio então a idéia que a justiça é a vontade, desejo, intenção do mais forte. Mas logo, Sócrates destruiu esse argumento, pois chegava em contradições. Até que então, no Livro II, Gláucon, lança um desafio ainda maior. Que a injustiça é mais justa por suas vantagens, para a pessoa. E o que o temor do injusto, é na verdade, ser capturado pela justiça, qual o impede de ser injusto, e assim alcançar todos os proveitos que se imaginar. É um argumento incrível, na verdade, são muitas páginas de argumento, que parece deixar Sócrates sem saída alguma. Nos lembra muito aquele salmo em que Davi lamenta, no 73, ao ver que os ímpios eram os que mais prosperavam. Mas é bem mais sólido, profundo, confesso que o argumento dele até mesmo me fez arregalar os olhos e baforar: "Nossa!".

Bem, mas ai Sócrates não busca desconstruir o argumento, mas construir o dele, de que o melhor modo é construir uma sociedade, uma cidade justa, que pense no melhor do conjunto, de todos. E assim não do individuo, não para um se dar bem e ser feliz, mas para todos fazerem uma cidade tão boa, tão ideal, tão justo, que por fim, todos, em sua medida vão compartilhar da felicidade desta. Não é uma construção pensando no individuo, mas na comunidade.

E aí, para isso, vai construindo desde o inicio, do inicio mesmo. Chegando até mesmo a ter a idéia de uma pequena comunidade, onde apenas vivem para a autosobrevivencia, semelhante a uma tribo. E além disso, então temos a ideia de uma Cidade Luxo, segundo Platão, e ai começa a desenvolver as idéias dos oficios desta cidade, e por ai vai, e o número minimo de cidadãos. Até que então chega na questão dos Guardiões (praticamente, os soldados), que é onde desenvolve seu grande foco. Bem, não vou aqui tentar fazer um resumo sobre isso. Mas nisto, Sócrates passa por diversas questões, desde a medicina, até a arte, literatura, alimentação, governo, educação. E por aí vai.

No inicio do Livro IV, Adimanto interpôs o discurso de Sócrates, dizendo que este tipo de guardião, qual Sócrates fala, é o mais infeliz dos homens, pois não pode ter nem conseguir vantagem nem prazer algum na vida, mas apenas vive com as condições minimas necessárias, apenas o que é indispensável, para viver para servir a cidade, protegê-la.

Bem, então Sócrates/Platão, solta esta pérola:

"- Na verdade, meu bom Adimanto, pode parecer que prescrições são muitas bastante pesadas; mas todas são realmente de pouca importância contanto que se observe, de acordo com o ditado, aquela única grande coisa que eu, de minha parte, não chamaria grande, mas suficiente para os nossos fins.
- E qual é ela? - perguntou.
- A educação e a criação. (...)
(...)
- Resumindo, então: este é o ponto em que deve concentrar-se acima de tudo a atenção de nossos governantes - que a música e a ginástica sejam preservadas em sua forma original, sem que haja inovações. Devem fazer o possível para mantê-las intatas e sentir medo quando alguém diz:

A todos os cantos preferem os homens
O que brota mais novo dos lábios dos cantores;

não vos perguntara acreditar os cidadãos que o poeta fale, não já de cantos novos, mas de um estilo novo de canto, e o celebrem por isso; pois não se deve celebrar tal coisa nem fazer semelhante suposição. Toda inovação musical é prenhe de perigos para a cidade inteira e faz-se mister proibi-la. Assim o assevera Damon, e eu o creio: diz ele, com efeito, que não se pode alterar os modos musicais sem alterar ao mesmo tempo as leis fundamentais do Estado.

- Inclui-me a mim também entre os convencidos - disse Adimanto.
- Portanto - continuei -, é no campo da música que nossos guardiães devem assentar os alicerces de sua fortaleza.
- Sim, pois é aí que a ilegalidade se insinua mais facilmente, sem ser percebida.
- Isso mesmo - respondi -, sob a forma de recreação, à primeira vista inofensiva.
- Nem a princípio causa dano algum - disse ele. - Mas esse espírito de licença, depois de encontrar um abrigo, vai-se introduzindo imperceptivelmente nos usos e costumes; e dali passa, já fortalecido, para os contratos entre os cidadãos, e após os contratos invade as leis e constituições, com a maior impudência, até que por fim, ó Sócrates, transforma toda a vida privada e pública.
-Será mesmo assim? - perguntei.
- É o que me parece - retrucou ele.
- De modo que, como dizíamos, nossos meninos devem ser educados desde o começo dentro de um sistema mais rigoroso, já que, se nem eles nem os seus jogos se atêm a certas normas, é impossível que, ao crescerem, se façam varões justos e operosos."

Platão, A República, Livro IV

Bem, durante o pouvo que li do livro, 1/3 aproximadamente, Platão já transcorreu muito sobre a música. É incrivel a observação dele. Isto mesmo, para uma época em que consideramos ainda como a música estando no berço. A escala pitagórica, mal tinha saído do forno e já temos isto. Algumas considerações são claramente bem questionáveis. Mas Platão liga música com a Educação. É como se A MÚSICA É O PRINCIPAL MEIO pelo qual ocorre um processo educativo. E de modo que tem um impacto incrível sobre as crianças, de modo a influenciá-las pelo resto de suas vidas. É também o principal meio, para ensiná-las sobre a religião, sobre o senso de justiça, sobre a comunidade, a cultura. E nisto, Platão critica muito Homero, pois em suas obras artísticas (poesias que eram cantadas, e assim gravadas), que falavam erroneamente sobre a divindade (em sua mitologia grega). Platão questiona o modo como os deuses eram tratados, e então Platão fala que essas alegações teologicas deles eram as MAIORES MENTIRAS EXISTENTES, a que pode CAUSAR OS MAIORES MALES a sociedade e a pessoa, em sua formação, sobretudo quando em idade mais tenra, que é a de mentir sobre a divindade; atribuir a eles idéias, estórias, fantasias, coisas ruins entre tantos outros. E que isto deveria ser totalmente combatido, eliminado da Educação.

....

Bem, o texto do Platão é bem claro, de como, a música, sutilmente vai transformando, corrompendo as pessoas, nos seus hábitos, pensamentos, costumes, e assim, também, no médio e longo prazo, tambem trazendo estes processos para a sociedade, o Estado, até mesmo as Leis e a Constituição.

E isso me fez pensar. Vamos retomar um pouco a História da Música. E podemos lembrar, como um grande marco, ao  meu ver, as valsas, a Familia Strauss, Johann Strauss (o pai da valsa). Bem, ela entrou sutilmente, e em pouco tempo, tinhamos bailes e festas a noite toda, e a burguesia dançando a madrugada inteira, nessas festas; de modo que chegou, num ponto, em que a a cidade decretou uma Lei proibindo-a (não lembro se totalmente, ou apenas a noite), pois dizendo que era um perigo, um male para a saúde das pessoas; pois as encava a ficar dançando a noite inteira. Ai depois, de destaque temos ao mesmo tempo a decadencia da música sacra, temos os sucessos das óperas de Richard Wagner; que introduziu, de certo modo, que ficou extremamente, claro no desenvolver do Romanticos, e fincou cravado no modernismo, um forte apelo a música que excita. Sim, em Malher pelo menos, temos que sentir cada vértebra e costelas do nosso corpo vibrar, a música tem quase que nos deixar em transe, incrivelmente impressionados. Ai no Modernismo, temos fortemente, a entrada do Blus, Jazz, tudo, foi indo sutilmente, e de repente, tinhamos Rock Roll, e por ai vai. O qual ninguem nega, que foi uma das maiores transformações e influencias pelo qual o mundo, sobretudo o Ocidente passou, que coincidiu com a Revolução Cultural, uma tentativa anarquista de por um cheque-mate na religião cristã, sobretudo a protestante, que fortemente predominava nesses países cristãos.

Bem, outro exemplo, podemos pensar aqui no Brasil. Sobretudo na década de 90, qual vivi. Eu pude contemplar claramente a música mudando tudo. Desde o inicio do Mamonas Assassinas que foi uma forte influencia, junto ao Axé, lembro até hoje da música, que mais marcou o inicio de uma grande mudança: "Vai descendo na boquinha da garrafa", e umas mulheres ultra-gostosas semi-nuas 'dançando'. No inicio um enorme vexame. Mas aos poucos isso foi penetrando, junto com outras coisas; sempre com a forte carga e apoio das músicas. Agora vendo melhor, NÃO EXISTIA MÚSICA, ESTILO MUSICAL para fazer oposição. Praticamente, tudo que era antigo, foi deixado para trás, censurado. Foi praticamente o que Platão queria fazer com o Homero, só que agora, no caso oposto, Homero censurou Platão. Bem, e ai hoje temos o que temos. Uma sociedade cada vez mais voltada em função das baladas, do sexualismo, da pornografia, do erotismo, da sensualidade, do dançar agarradinho, do mostrar 'o corpo'. E por ai vai, além da curtição da bebida e tals. Bem, conheço muitos, talvez a maioria dos jovens, hoje, vivem em função de beber, paquerar, balada, sexo, nos fins de semana e feriados. E a nova geração então, bem, vai ver como é a turminha hoje dos 10 - 16 anos, exatamente a mesma coisa. Bem, imagine a próxima geração. Além disso, temos visto junto a isso, a essas transformações musicais, a midia, entre tudo mais, trazendo uma idéia cada vez menos séria sobre a vida e a moral, é tudo questão de curtição. E os programas de humor negro e baixaria prosperaram na TV como mofo em um quarto umido fechado. E junto a isso, começamos a ter um forte movimento Homossexual, de modo, a que chegamos ter o absurdo de um "casamento" gay. (ou seja, a palavra casamento perdeu totalmente sua conotação original), e agora, estamos tentando até mesmo um movimento pro uso da Maconha (fortemente defendido pelos Fefeletianos da USP). E as Leis do pais vão indo nesse sentido. Vão se modificando, em primeira instancia, a permitir todas estas e coisas. E em segunda, a educar as novas gerações a 'aceitar', 'conviver', e 'viver' com isso.

Ironicamente. POuco antes, no final do livro III, Sócrates, diz que é preciso testar os guardiões, para ver se são realmente justos e tudo mais, se vivem de acordo, se não se caem em suas ambições, tentações, desejos carnais, entre tantos outros. Pois estes, os guardiões, tinham que ser plenamente infalíveis, sem uma mancha de erro, o culpa. Nós diríamos, isto é um absurdo. Mas segundo Platão, é porque a Educação feita a eles foi falha, e não como a da cidade que ele está desenvolvendo, imaginando (e para isso, esses guardiões, nunca poderiam ter tido o contato com este tipo de música). Bem. Mas ai, Platão, diz que também seria preciso testá-los num grande tipo de mentira, num grande tipo de engano. Uma mentira extremamente absurda. Mas que ninguem acreditaria. O próprio Glaucon disse isso. "Como seria possível alguem acreditar numa mentira dessas?" E no caso, era algo sobre a origem deles, que as pessoas viveram aprisionadas a juventude inteira na terra (solo, chão)... E aí, desenvolvendo a idéia, Sócrates diz que ninguem acreditaria. Mas bastava jogar a idéia, falar dela, e as vozes do povo se encarregaria de começar a espalhar ela essa mentira. Talvez ninguem acreditaria. Mas seria possível, de que a proxima geração fosse educada ouvindo essa mentira, e assim, sucessivamente, chegaria uma geração, que para elas essa mentira seria verdade, alias, teriam a plena confiança de que tal era o verdadeiro fato. E bem, segundo Platão, esta seria uma prova máxima aos guardiões, mas que não teria como fazê-lo. A menos que tais pudessem viver por várias gerações, sei lá.

E ai temos a grande ironia, de que este mesmo processo, veio ocorrendo no mundo. Através da música. Veja as transformações que a música fez na cultura e tudo mais nos últimos anos e décadas. Se há não muitas décadas atrás, tinhamos uma grande predominancia de forte poder e convicção cristã no Ocidente, e muitas leis morais, comportamentais, tradições. Bem, e ai temos, uma grande mudança, que não preciso relatar. A grande mentira, segundo Platão, que apenas sutilmente, de geração em geração, poderia ocorrer, de fato, ocorreu. Fomos pegos! Mesmo Platão nos avisando, há milênios!

Agora, mais incrivel ainda é quando pensamos na introdução do Senhor dos Anéis de Tolkien, que seria o Simarilion. A batalha música, vamos assim dizer, dos valar, com Eru. Bem, e ai temos a consideração, cristã, biblica, sobretudo de Ellen G. White, sobre como Satanás, através da música, sutilmente conseguiu se instalar nas igrejas, e causar grandes dominios e males, com sutis enganos; transformou a cultura, os modos, as tradições e tudo mais.

Bem mais irônico ainda. É que Platão, milênios atrás. Nos primódios da música, já conseguia refletir e pensar sobre a música em aspectos, que hoje, pessoas que se dizem instruidas, e de alta capacidade mental, intelectuais, e musicistas, não conseguem perceber. E acham que é tudo "bobeira". Bem, só me dizem uma coisa, "como hoje chegamos a ter esses funks, que classico como 'música pornográfica'"? E por aí vai.

É só para constatar que Platão, já havia predito, algo que mudou nosso mundo, e de certo modo, 99% das pessoas não se deram conta, e não dão a minima: "A música.": "Toda inovação musical preenche de perigos a cidade inteira."

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