07 junho 2010

Consumo, Um Vazio ao Cubo

Em 24 horas pude vivenciar um contraste astronomico. No feriado de 3/junho participei de uma trilha na Serra do Mar e no dia seguinte fiz compras no Shopping. – Que contraste!

Na praça de alimentação do Shopping comecei a reparar o ambiente, com centenas, talvez milhares de pessoas, correndo, e fazendo muito barulho. Se abrisse os ouvidos para prestar atenção nos sons ambientes, ficaria estressado, com dor de cabeça e severamente incomodado. Já na Serra do Mar, não estava cercado por milhares de pessoas, mas uma quantidade ainda maior de árvores e plantas que de algum modo tornava a contemplação do ambiente aconchegante. O que dizer então do som? Uma mistura de uma serena quietude, ao som de fundo, calmo de um rio e uma cachoeira, e que em alguns momentos era enriquecido pelo cantar dos pássaros. Ali na Serra do Mar, poderia tranquilamente amarrar uma rede entre duas arvores e passar horas contemplando aquilo, já no Shopping, não diria o mesmo.

Ainda na praça pude reparar na expressão de muitas pessoas enquanto comiam. E em geral, não se via nenhuma expressão de satisfação com aquilo que comia, apesar de ter visto isso em duas crianças ao morder o MacLancheFeliz. Eram comum ver pessoas usando condimentos além do que já havia, tomando alguma bebida junto; um casal, não socegou enquanto não compraram um shop. Ao mesmo tempo, que muitas pessoas pareciam estar em dúvida se realmente deveriam ter comido aquilo. E mesmo após a refeição, se via as pessoas sentadas de algum modo apreensivas, talvez com indigestão; mas não se via o animo e a gratidão por tal refeição. Na verdade, era uma paisagem de horrores de guerra a praça de alimentação.

Já na trilha que diferença. Além de poder beber da cristalina água direto do manancial, que revigora o corpo no primeiro gole, e que realmente da gosto de beber. Após 3 horas de caminhada paramos de vista para uma bela cachoeira para uma refeição. E não só o ambiente, mas a atividade física em si, proporcionou um enorme prazer e satisfação ao comer simples alimentos, alguns amassados, levados de casa; e nem foi preciso comer tanto para se sentir plenamente satisfeito. E o mesmo podia ver nos olhos daqueles que me acompanhavam.

No Shopping, praticamente todos estavam “bem vestidos”, isto é, com roupas aparentemente novas e pouco desbotadas. Mas que ao mesmo tempo, intocáveis, de modo algum se interagiam com o ambiente e as coisas, de modo que pudesse sujar a roupa, ou desfazer o penteado, ou mesmo suar a camisa. Assim, pareciam um monte de robôs perambulando pelas vitrines e lojas, tão próximos, mas ao mesmo tempo, tão individualizados que pareciam intocáveis e de algum modo solitários. Na trilha, a história era outra, todos com roupas simples, velhas, mas confortáveis. Não se importavam de interagir com o ambiente. Alias, muitos ficamos sujos de lama. Ora se sentava na lama e em pedras, ora interagia com galhos, plantas e flores, na maioria das vezes, molhadas. Vazia-se todos os movimentos possíveis até mesmo se arrastando. Todos suavam, todos fediam, mas de algum modo, isso não importava, não incomodava ninguém. Havia toque, não éramos isolados, mas um só com a natureza e o próximo. O que dizer então das vestes das plantas, arvores, rochas e dos pássaros?

No Shopping um sentimento de ambição, vaidade e poder sempre pareava no ar. Esse era o cheiro do consumo, e das pessoas pegando e avaliando roupas e coisas, tentando responder a pergunta: “Se eu comprar isso, me fará melhor, mais feliz?” Se a resposta era “não”, então descartavam, e iam para o próximo objeto; até que houvesse algum “sim”, e então, no caixa, mostravam seu poder de adquirir-se ‘felicidade’, com seus cartões de crédito. [O que dizer dos infelizes, que diziam “Sim”, mas o bolso, “Não”?] Eu mesmo passei por isso. É uma mistura de infelicidade e esperança ao escolher e experimentar peças de roupa. Por mais que tentasse seguir o ideal de Sêneca de se vestir de modo a ser uma benção para os outros, demonstrando a simplicidade, o contentamento, a falta de ambição e vaidade, mas ao mesmo tempo, mostrando a elegância digna de todos os homens e da sabedoria; ora eu me via em algum pensamento vaidoso, se aquilo me caiu bem; ora quase como se precisasse comprar aquilo para de algum modo sentir melhor. Até gastei mais do que pretendia, porque não bastava uma camisa, uma calça, era necessário uma para o trabalho, uma para igreja, uma para o casual. - Quanta vaidade!

Talvez seja o mais infeliz dos consumidores, ou o único que se sente mal ao se consumir coisas desnecessariamente [que muitos diriam necessário]. Mas enquanto saia de uma loja, um pensamento passou em minha mente: “Por que para cada peça de roupa que eu compre, eu não compre 2 para um pobre necessitado? Aliás, está tão frio.” Mas logo isso foi rejeitado quando pensei em meu orçamento. Porém, e se um garoto me abortasse e dissesse: “Tio quanta roupa você comprou. Me dá uma?” – Oh! Egoísmo, onde eu te fuzilo?!


Já na trilha não havia tais pensamentos. As roupas eram realmente roupas. Apenas reparávamos se tais roupas eram confortáveis, nos mantinham bem aquecidos e nos protegiam dos arranhões. Me sentia um afortunado, pela minha calça de mais de 5 anos secar rapidamente após molhar. E quantas peças de roupas? O mínimo possível, apenas o suficiente, caso contrário, até mesmo se tornaria um fardo na mochila e em nossos ombros.

Ali dentro do mato, como é simples. É tão pouco o que precisamos. Ë sempre suave, é paz, é satisfeito, é tranqüilo. Até o ar parece nos inspirar vida e energia. Já na cidade, tudo gira em uma utopia, nunca é o suficiente, nunca é satisfatório; e muito se faz para consumir, e viver, num lugar onde o ar, realmente, apenas nos inspira um pouco de morte.

Lá nossas pernas nos locomoveram por mais de 20 km. Aqui, que sirvam apenas para desembarcar do transporte e caminhar pelo Shopping, tão plano e liso, que as pernas nem parecem necessárias.

Acho que nos Shoppings, vemos a essência de uma vida urbana capitalista. Acho que vejo muitas das essências de um ser humano pós-moderno.

Que deprimente.

Por outro lado, como isso alimenta na alma a esperança de uma vida retirada. A qual, se não ocorrer aqui, neste mundo; virá no por vir, na casa que Jesus preparou.

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